Pensata

Vaguinaldo Marinheiro

22/09/2002

A doutrina Bush e a indignação mundial

Causou indignação em muitos a divulgação na sexta-feira da "doutrina Bush", conjunto de diretrizes de segurança nacional e de política externa desenvolvido pelo governo norte-americano e que foi enviado ao Congresso.

No documento, os EUA se assumem de vez como império, como xerife do mundo. Sem eufemismos, está lá que eles vão atacar, mesmo sem apoio internacional, qualquer país ou grupo que possa representar uma ameaça aos americanos. Chamam isso de ataque preventivo.

Também consta do texto que não permitirão que nenhum Estado tente igualar o poderio militar norte-americano. Ou seja, só poderá existir uma potência bélica no mundo, que é e continuará sendo os Estados Unidos.

Houve indignação, mas há muita lógica na postura americana. Para o público externo, George W. Bush reforça o lema de "ou vocês estão conosco, ou estão contra nós", lançado depois dos atentados de 11 de setembro de 2001.

Em miúdos, o que está escrito é: como nós somos mesmo "o" império do mundo (não há paralelo para nosso poder militar e na área econômica somos o dínamo do planeta) temos o direito de definir as regras da convivência internacional. E que todos concordem.

Mas não é o mundo que interessa ao presidente americano. Ele não é candidato a "mister simpatia" mundial, nem pleiteará um cargo na ONU quando deixar a Presidência.

Seu foco é o público interno americano, aquele que vai às urnas agora em novembro para escolher governadores e parlamentares e aquele que irá votar de novo para presidente em dois anos.

Na eleição mais próxima, Bush busca o aumento da bancada republicana, para lhe dar folga no Congresso. Nos Estados, também precisa de mais governadores de seu partido, inclusive seu irmão, Jeb Bush, que busca a reeleição na Flórida.

Para daqui a dois anos, precisa restabelecer sua popularidade para não fracassar como seu pai, George Bush, que perdeu para Bill Clinton na tentativa de reeleição.

E é para esse público interno, para a maioria de "rednecks", que Bush está agora endereçando seu discurso. Para esses, só há um interesse: restabelecer a certeza de que os Estados Unidos são um país invulnerável, que todos estão seguros, que terrorismo é algo que acontece lá longe, que não haverá mais aviões caindo sobre prédios, que não há ameaças para as usinas nucleares. Enfim, que a vida vai voltar ao que era antes do 11 de setembro.

Para esses, Bush quer passar a impressão de pai zeloso, aquele que faz qualquer coisa para manter a segurança dos filhos.

Dará certo essa nova doutrina Bush? Como sou daqueles que não acreditam na previsibilidade ou lógica histórica, não arrisco responder. Mas, como palpite, diria que num médio prazo vamos viver em um mundo ameaçado, às voltas com no mínimo expectativas diárias de guerras.

Parece, e é, pouco promissor para aqueles que sonhavam com tempos de paz depois do fim da guerra fria.
Vaguinaldo Marinheiro é secretário-assistente de Redação da Folha de S.Paulo. Escreve para a Folha Online aos domingos

E-mail: vaguinaldo.marinheiro@folha.com.br

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