Pensata

Eliane Cantanhêde

21/08/2005

Enfim, alguém reage

A crise política deixou Lula pequeno, isolado, perplexo. Mas, quando as denúncias chegaram a Palocci, o ministro da Fazenda cresceu, enfrentou, foi firme e convincente. Essa costuma ser uma diferença fundamental entre meros governantes e os estadistas, entre meros políticos e os líderes.

Palocci fez, enfim, o que Dirceu, Gushiken, Genoino e principalmente o próprio presidente da República deveriam ter feito desde o início: foi a público e defendeu-se categoricamente. Em vez de uma fala contrita ou chorosa, sem vida e sem argumento, o ministro fez um pronunciamento vigoroso e se submeteu a cerca de duas horas de perguntas livremente formuladas por jornalistas.

Respondeu uma a uma, com calma e segurança. Negou categoricamente a versão de seu ex-assessor Rogério Tadeu Buratti de que recebia R$ 50 mil de proprina na Prefeitura de Ribeirão Preto para entregar ao PT.

A reação tem efeitos imediatos muito importantes: ratifica a continuidade da política econômica, acalma a reabertura dos mercados amanhã, dá sobrevida ao governo e tira Lula, por enquanto, da mira principal. Além de deixar a oposição com apenas meio discurso.

A questão, porém, não pára aí. As investigações continuam, Buratti está vivo, sabe das coisas e apenas verbalizou o que há muito o mundo político comenta: que havia focos de corrupção em prefeituras petistas para abastecer os cofres do PT. No centro delas, a de Ribeirão Preto, com Palocci, e a de Santo André, com o prefeito assassinado Celso Daniel (aliás, a primeira opção para o Ministério da Fazenda de Lula).

Ou seja, hoje foi um grande dia para Palocci e para o governo, que saíram do isolamento e passaram a dar as cartas. Mas muita coisa ainda pode aparecer. O fundamental, agora, é que não surjam fatos ou provas que derrubem toda a força e a firmeza do ministro hoje. Entre ele e Buratti, um fala a verdade e o outro, a mentira. Os fatos e as provas é que vão desempatar o jogo.

Ou seja: o pronunciamento e a entrevista de Palocci foram o melhor momento do governo desde o início desse longo e tenebroso inverno de denúncias que atingiram a alma, os principais homens e a cúpula do partido de Lula. Mas a crise ainda está no meio. Nunca se sabe o dia de amanhã. E, o que é pior: as denúncias e as provas de amanhã.

Além disso, o Planalto não tem ainda como comemorar. A acusação de Buratti contra Palocci é apenas uma, entre um turbilhão de outras. E o Marcos Valério, as contas no exterior, o "mensalão", o Waldomiro, a cueca, o apartamento do Pizzolatto, o contrato da Telemar com o filho do presidente?

Palocci falou por ele. Mas as denúncias atingem a todo um partido e a todo um governo.

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    Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Participou intensamente da cobertura do choque entre o Boeing da Gol e o jato Legacy, em setembro de 2006.

    E-mail: elianec@uol.com.br

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