Pensata

Eliane Cantanhêde

15/03/2006

O jogo está jogado

José Serra queria vencer a eleição em segundo turno sem passar antes pelo primeiríssimo turno: a disputa interna no PSDB. Candidato tucano em primeiro lugar nas pesquisas contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele descuidou das articulações no partido e, quando olhou em volta, era uma ilha cercada por governadores, dirigentes regionais e parlamentares apoiando seu adversário, Geraldo Alckmin.

Alckmin ganhou a disputa pela persistência e pela habilidade, mas tem um desafio inverso ao de Serra: ganhou o primeiríssimo turno, mas tem que correr contra o tempo e crescer 25 pontos percentuais para empatar com Lula, passar pelo primeiro turno e ganhar do favorito Lula no segundo. Isto é, se houver segundo turno.

O grande temor da oposição, compartilhado entre o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e pelos dirigentes do PFL e do PMDB que defendiam abertamente a candidatura Serra, é que Alckmin não tenha fôlego para crescer rapidamente nas pesquisas para chegar ao início da propaganda eleitoral em pé de igualdade com Lula. E que, se a eleição for mesmo polarizada entre PT e PSDB, com poucos candidatos, o desfecho repita 1998 e dê a reeleição do presidente no primeiro turno.

O PMDB está prestes a derrubar as prévias marcada para o próximo sábado e enterrar, assim, a natimorta candidatura de Anthony Garotinho --o candidato que mais assusta, ou assustava, o Planalto.

Sem ele e sem Enéas Carneiro, do Prona, que estaria doente e impossibilitado de concorrer, só estão certas as candidaturas de Lula, Alckmin e Heloísa Helena (PSOL). E poderia haver apenas mais três candidatos: um do PPS, um do PDT e outro --o tal de Eymael, que não conta. É assim que se constroem vitórias em primeiro turno: poucos candidatos, só um ou dois com reais condições de competitividade.

Ou seja: com Alckmin, aumenta consideravelmente o risco da oposição. E o discurso para neutralizar esse temor é o de que Serra é muito conhecido, tem o "recall" da candidatura presidencial de 2002 e já bateu no teto, enquanto Alckmin é a novidade, bom de vídeo, tem empatia com as classes C, D e E e o céu é o limite para seu crescimento na campanha. A ver.

Por enquanto, vale sempre o bom e velho pragmatismo do experiente Bornhausen, para quem o mais importante é que Lula parou de criar novidades, divulgar programas de impacto e já cansou com um discurso que ele, Bornhausen, considera populista. Por isso, pararia de crescer nas pesquisas. E, a partir das novas denúncias que não param de aparecer, principalmente contra o principal pilar do seu governo, Antonio Palocci Filho (Fazenda), começaria a cair.

Ou, no português mais claro, mais mastigado, mais do que contar com Alckmin para vencer, a cúpula do PFL parece mais confiante no próprio desgaste de Lula.

"Lula é quem vai derrotar Lula", analisa Bornhausen. Mas, cá para nós, ele já esteve bem mais animado com as chances de vitória da oposição.
Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Participou intensamente da cobertura do choque entre o Boeing da Gol e o jato Legacy, em setembro de 2006.

E-mail: elianec@uol.com.br

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