Pensata

Eliane Cantanhêde

21/03/2007

Nunca antes neste país

Estranha a rotina do governo Lula: desde a eleição, lá se vão quantos meses?, o presidente não conseguiu fechar a reforma ministerial nem acabar com o caos aéreo.

Na reforma, o Planalto soprava que haveria "grandes nomes" para as principais pastas, mas os interinos foram formalizados numas, o PMDB acabou abocanhando cinco, Lula foi empurrando Marta Suplicy para um canto até acomodá-la no Turismo. Se havia grandes nomes, evaporaram.

O grande símbolo da atual "reforma", assim mesmo entre aspas, ficou sendo o vexame do tal deputado Odílio Balbinotti, do PMDB do Paraná, que não resistiu a uns quatro ou cinco dias de reportagens sobre "laranjas" e otras cositas más nas suas empresas. Lula estava pronto para nomeá-lo sem ter a menor idéia de quem se tratava. Não viu, não sabia. E Balbinotti foi ministro sem ser.

Agora, depois do vexame maior, a escalada de vexames diários, com uma lista de ministeriáveis do PMDB incapaz de passar pelo crivo da folha corrida. No fim, vai acabar dando na Agricultura o deputado Reynhold Stephanes, ex-ministro da Previdência, por exclusão. Parece ser o único de "ficha limpa".

No caso do apagão, a toada é a mesma. Cai o Boeing da Gol, começa um empurra-empurra de culpas e culpados, vem a operação padrão dos controladores, sucedem-se os "apagões" e, na sequência, três panes seguidas no sistema: no rádio do Cindacta-1, de Brasília, depois no próprio sistema do Cindacta-4, de Curitiba, e agora de novo, no de Brasília.

Com detalhes, digamos, estranhos: alguém aí já ouviu falar de queda de energia em aeroporto? Pois no domingo passado, simultaneamente à pane no Cindacta-1, o aeroporto de Brasília, um dos mais nevrálgicos do país, sofreu um blecaute. Não funcionavam fingers, esteiras de bagagem, banheiros, mostradores de partidas e chegadas de vôo. Durante horas!

Outro detalhe estranho: jaboti não sobe em árvore, mas cachorro invade o aeroporto de Congonhas, instala-se sem cerimônia na pista e causa um pandemônio. Nada disso pode ser sério.

E o que Lula faz? Desde outubro, a cada um desses apagões ou panes, ele se reúne com Dilma Rousseff, Waldir Pires, um general daqui, dois ou três brigadeiros dali, e a imprensa registra que o presidente está irritado e quer soluções. Quais? Não se sabe, não se viu.

Os controladores são poucos, ganham menos do que deveriam e --o que é pior-- são malpreparados. Eles estão ansiosos, pressionando. E o governo não dá respostas nem para eles nem para nós, os usuários.

O que era para ser exceção vira rotina: a reforma ministerial vira assunto e preocupação de todos os dias, durante meses, e o caos aéreo veio para ficar.

Como diria Lula, "nunca antes se viu algo assim na história desse país".
Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Participou intensamente da cobertura do choque entre o Boeing da Gol e o jato Legacy, em setembro de 2006.

E-mail: elianec@uol.com.br

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