Pensata

Alcino Leite Neto

16/08/2002

Moneo, o novo porta-moedas eletrônico francês

A partir do final de 2003, os franceses não precisarão mais carregar dinheiro no bolso. Basta que tenham o porta-moedas eletrônico Moneo, um novo cartão bancário para pequenas compras, seja um jornal, seja uma baguette.

A chegada do Moneo vai significar mais uma mudança na economia cotidiana dos franceses, que em 1º de janeiro deste ano tiveram que se adaptar ao euro, a nova moeda de 12 países europeus. Até hoje, várias lojas em Paris ainda continuam a exibir os preços em euros e francos, a velha moeda.

O Moneo (pronuncia-se moneô) permite pagamentos miúdos que não são aceitos pelo cartão bancário tradicional, já amplamente utilizado no país. Em 2001, o número de compras feitas com cartão ultrapassou as realizadas com cheques.

O porta-moedas eletrônico já está sendo usado, desde o início do ano, em várias cidades do interior do país, como Bordeaux e Lyon. O sucesso foi tão maior do que o esperado, atingindo em média 20% das transações, que os bancos resolveram em junho acelerar a sua adoção em outros locais.

Até dezembro, 60% do território terá acesso ao Moneo. Paris começa a usá-lo em novembro próximo. Em janeiro de 2004, a França inteira estará utilizando o novo cartão.

"A resistência das pessoas é o nosso maior problema, mas ela tem sido muito menor do que esperávamos. Em seis meses, tivemos 12 milhões de operações com o Moneo", diz Pierre Fersztand, diretor-geral do BMS (Billetique Monétique Services), empresa que desenvolve e explora o novo cartão e cujos acionistas são os principais bancos franceses, como a Societé Generale e o BNP-Paribas.

O uso do porta-moedas eletrônico é bastante fácil. Nas compras, ele funciona como o cartão convencional, embora a transação seja mais rápida, pois dispensa a digitação da senha secreta. O caixa coloca o cartão no terminal eletrônico, e o cliente precisa apertar apenas um botão autorizando o débito.

O valor será descontado de um total de 100 euros (cerca de R$ 300), o máximo disponível no cartão, que é independente da conta bancária. As compras podem ser de alguns centavos, como a baguete (0,80 euros, em média), mas não devem ultrapassar a cada vez o valor de 30 euros.

Quando acabam os 100 euros disponíveis, o cartão precisa ser "recarregado" com a mesma soma. Para isso, o seu titular usa um terminal Moneo no banco ou o próprio aparelho de pagamento na loja.

Nas cidades que estão usando o Moneo, o montante médio gasto em cada compra com o cartão tem sido de 4 euros (cerca de R$ 12). Já existem 27 mil terminais do novo cartão no país.

O Moneo também está sendo implantado nos cartões bancários convencionais, que terão assim dois usos diferentes. Para evitar que as contas sejam tumultuadas com pequenos débitos, o usuário transfere 100 euros para uso na "faixa Moneo" do cartão.

"Vou ter que andar com uma máquina dependurada no pescoço, se todo mundo resolver pagar com cartão", diz o garçom Jean-Marie, 48, num café perto do Louvre, em Paris. Para ele, as gorjetas também tenderão a sumir. "Acabou o troco, acabou a gorjeta."

A funcionária pública Adette, 40, como Jean-Marie, nunca tinha ouvido falar no Moneo. Ao saber do que se trata, encontra logo uma vantagem no produto. "Vai acabar com o meu saco de moedas dentro da bolsa", exclama, e pergunta: "Mas será que não vai aumentar a fila no comércio?".

"Se for como você está me contando, vai ser mais fácil e prático, porque não vou precisar contar moedinhas de troco o tempo todo", afirma Laasel Morad, 26, proprietário de um pequeno mercado de frutas na rua Saint Honoré.

Morad diz que a maioria dos pagamentos em sua loja são feitos em dinheiro, e não em cartão. "São pequenas compras, mas vou pensar duas vezes antes de usar esse Moneo, por causa das tarifas bancárias."

As tarifas para a utilização do sistema Moneo serão negociadas pelos comerciantes com os bancos e vão variar entre 0,9% e 3% do valor da compra.

"Você acha que alguém vai comprar um selo com cartão?", indaga Mohammad, 21, desempregado. "O dinheiro não acabará nunca. Esse cartão é para as pessoas não perceberem que estão gastando."

Para Fersztand, o Moneo deverá estar incorporado ao hábito dos franceses em no máximo quatro anos. "O cartão bancário tradicional levou dez anos para se impor. O Moneo parece que o conseguirá em menos tempo. Os nossos principais problemas são a mudança de hábito e os comerciantes que preferem o pagamento em dinheiro para não declarar imposto", afirma o diretor-geral do BMS.

Fersztand julga que o Moneo é um caminho irreversível para a adoção majoritária do dinheiro eletrônico, mas não acredita que as moedas e notas desaparecerão. "Elas existem há milênios."

Ao contrário do Brasil, os crimes envolvendo cartões bancários na França não são tão frequentes. As preocupações com a segurança se voltam mais para as possibilidades de furto e falsificação do que de assaltos no caixa eletrônico ou de sequestro para a retirada posterior de dinheiro.

Por isso, o uso dos cartões é tão generalizado na França. É comum ver, em Paris, pessoas tirando dinheiro de madrugada em caixas abertos para a rua. "Roubar um cartão é complicado: é preciso saber o seu código e usá-lo antes de o seu dono pedir o cancelamento. Mas não há muito o que fazer se você tiver um revólver apontado para a sua cabeça", diz Fersztand, ao saber como os cartões são cobiçados pelos criminosos no Brasil.
Alcino Leite Neto, 46, é editor de Domingo da Folha e editor da revista eletrônica Trópico. Foi correspondente em Paris e editor do caderno Mais! Escreve para a Folha Online quinzenalmente, às segundas.

E-mail: aleite@folhasp.com.br

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