Pensata

Antonio Carlos de Faria

20/02/2004

Carnaval em Londres

Como identificar um turista estrangeiro em Ipanema ou Copacabana? Basta ver quem está vestido com camisas da seleção brasileira ou roupas que façam alusão ao verde-amarelo.

Trata-se de uma manifestação de mimetismo, fenômeno em que certos seres vivos assumem cores e características do ambiente. Pode ser um mecanismo de defesa contra predadores. Mas no caso do animal turístico é mais provável que seja uma demonstração do desejo de imergir na cultura local.

Seja lá qual for a intenção, o efeito desse tipo de disfarce é o contrário do esperado. Como geralmente os brasileiros não andam por aí vestidos de bandeira, os gringos acabam por se destacar na paisagem em que queriam passar despercebidos.

Será que vem daí a expressão "dar bandeira" ?

O que os turistas parecem não saber é que o nacionalismo é um fato raro que só envolve o Brasil em situações específicas, como as Copa do Mundo.

Outra coisa que os estrangeiros não sabem é que nem todos os brasileiros são bons de bola ou têm a ginga necessária ao samba. Um amigo recentemente foi vítima desse engano e quase perdeu o emprego por ter um desempenho miserável nesses dois ícones universais da brasilidade.

O sujeito, em viagem à matriz de sua empresa na Inglaterra, foi convidado para uma pelada com seus colegas londrinos. De nada adiantou ele advertir a turma sobre suas limitações esportivas. Todos acharam que ele estava escondendo o jogo, estratégia brasileira para surpreender os adversários.

No dia da partida, foi recebido como celebridade, com direito a fundo musical composto por velhas músicas de Jorge Ben Jor, da época em que o artista ainda era Jorge Ben. Antes do apito inicial foi incitado a mostrar alguns passos de samba. O fiasco começou ali e continuou durante o jogo.

Mesmo os desajeitados ingleses perceberam que aquele brasileiro não correspondia ao estereótipo. Começaram a olhá-lo de forma estranha. Ele se sentiu um farsante por ser ele mesmo. Quase confessou que não era brasileiro e sim uma versão mais barata, talvez tão boa, porém "made in China".

O fato é que sua reputação ficou abalada. Sua traição às expectativas alheias estava sendo interpretada como um indício de que ele também não seria confiável no mundo dos negócios.

Sorte a dele que pôde compensar o mau desempenho, demonstrando ser bem brasileiro em outros departamentos. Salvou seu emprego exercendo a criatividade e a alegria.

Antes de embarcar, promoveu uma festa em um pub, convidando os frustrados colegas de trabalho e vários amigos e amigas brasileiros que tem em Londres.

A noite, uma espécie de baile pré-carnavalesco, foi um sucesso. Como brinde, distribuiu até algumas camisas da seleção, que os ingleses vestiram na hora para parecerem brasileiros.
Antonio Carlos de Faria é jornalista e vive no Rio de Janeiro. Escreve para a Folha Online às quintas

E-mail: acafaria@uol.com.br

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