Pensata

Antonio Carlos de Faria

09/04/2004

A evolução dos dinossauros

Duas semanas de descanso propiciaram bastante tempo para o exercício de um grande prazer: a leitura do noticiário sobre novas descobertas científicas.

Mas, contrariando a experiência e a expectativa, dessa vez não apareceu nenhuma outra hipótese sobre a extinção dos dinossauros.

Talvez esse seja o assunto mais recorrente desse tipo de jornalismo, o que não quer dizer que seja o de maior atenção das ciências. Por motivações até inconscientes, trata-se da novela científica que os jornalistas consideram dar mais ibope.

Podem prestar atenção. Não passa um mês sem que jornais e revistas tragam notícias sobre uma nova descoberta que mudaria radicalmente o que se supõe ter acontecido aos extintos dinossauros.

Dependendo das diversas concepções, eles podem ter desaparecido ou por causa do impacto de um asteróide, ou por mudanças climáticas bruscas, ou por falta de alimentos, ou por uma combinação desses fatores. Há mesmo quem acredite que não houve extinção coisa nenhuma. Teria havido sim evolução.

Essa vertente tem ares místicos e prega que os dinossauros alcançaram um alto estágio de desenvolvimento tecnológico. Foram embora da Terra, depois de apagar os vestígios de sua civilização.

Eram os deuses dinossauros? Isso é um mistério. O que se sabe é que deixaram para trás os ossos de seus antepassados. Imaginem se acaso voltassem e descobrissem como seus cemitérios foram profanados...

Tão interessante quanto acompanhar as novas teorias sobre os dinossauros é tentar entender o motivo de o assunto causar tanto fascínio. Afinal estamos falando de coisas que aconteceram há milhões de anos, não anteontem.

Talvez o que torna o tema tão apaixonante seja justamente o fato de estar separado do presente por uma infinidade de tempo. É possível e até natural adotar um distanciamento cósmico em relação aos dinossauros, uma perspectiva que revele novos ângulos, aprimore a visão.

Esse é o tipo de exercício que às vezes tentamos e não conseguimos em relação a problemas do cotidiano. Ficamos mergulhados nas águas rasas do mangue político, econômico, nas ilusões que cercam o transcurso da nossa vida.

Talvez enxergássemos melhor o emaranhado que nos envolve, caso pudéssemos nos distanciar, ver as coisas em seu contexto, dentro do conjunto do qual fazem parte.

É um erro pensar que tanta preocupação com os dinossauros seja uma fuga diante de temas mais prementes. No lugar de fugir, a abordagem desse assunto vai ao encontro de uma das grandes preocupações do homem: a extinção de sua própria espécie, o fim da civilização humana. Não só a morte individual causa calafrios com sua ameaça de que nada de nós subsista no universo.

Os dinossauros desapareceram há mais ou menos 63 milhões de anos. Deles restaram ossos e pegadas. O que do homem permaneceria depois de tanto tempo?
Antonio Carlos de Faria é jornalista e vive no Rio de Janeiro. Escreve para a Folha Online às quintas

E-mail: acafaria@uol.com.br

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