Pensata

Antonio Carlos de Faria

04/07/2002

Fenômenos

Há uma avalanche de comentários procurando fazer da vitória na Copa do Mundo uma metáfora sobre a capacidade de superação do brasileiro.
Dedicar essa crônica ao tema iria apenas apresentar mais um candidato ao troféu rodrigueano do óbvio ululante. Prefiro trocar de assunto, embora continue falando sobre a mesma coisa. Quero tratar de fenômenos relacionados ao futebol.

O primeiro dos mais marcantes foi o verdadeiro batismo de Brasília. Finalmente a cidade-mausoléu mostrou que ali pulsa um coração coletivo, o que a credencia a ser de verdade a capital do país. Nem nas manifestações pelo impeachment de Collor se viu tamanha multidão pelos eixos monumentais, num delírio de santa sandice cívica.

O segundo fato inesperado foi a elevação do Jardim Irene a ícone da nacionalidade. Antes de Cafu apresentá-lo a pelos menos dois bilhões de
telespectadores, o Brasil só tinha gerado dois bairros mundialmente conhecidos, Copacabana e Ipanema. Que o país aproveite essa chance
inigualável de se olhar no novo espelho.

Quanto ao fato de pessoas no Rio terem apedrejado o ônibus dos campeões, isso foi mais uma demonstração de como o amor pode rapidamente
se transformar em ódio. Principalmente se o ser amado chega tarde ao encontro e logo depois volta para a rua.

Porém estes são fenômenos sociais. O maior fenômeno desta Copa é o fenômeno Ronaldo, já chamado assim mesmo quando ainda não o era de
fato -o que certamente cria um problema para quem não acredita em premonição.

Não me lembro de uma grande partida de Ronaldo pela seleção, antes dessa Copa. Para mim, se ele era um fenômeno, isso só se manifestava nos
clubes em que atuou.

Mesmo assim, e depois de ter ficado dois anos sem jogar uma partida completa, foi convocado por Felipão, que, contra a opinião de muitos,
entre os quais me incluo, mostrou que estava certo e que também é um fenômeno, de obstinação e de fé.

Antonio Carlos de Faria é jornalista e vive no Rio de Janeiro. Escreve para a Folha Online às quintas

E-mail: acafaria@uol.com.br

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