Pensata

Antonio Carlos de Faria

18/04/2003

Aleluia, vamos malhar!

Quem você escalaria para ser o boneco, no dia da malhação de judas?

Não diga que você não é disso, pois entre nós não é preciso sucumbir ao politicamente correto, essa praga que vem disseminando o bom-mocismo como se fosse sinônimo de civilidade.

Há alguns anos os guardiões do bom-mocismo
começaram a reprovar as manifestações remanescentes da antiga tradição de malhar o judas, que ainda ocorre em alguns bairros das grandes cidades e nos municípios do interior.

O discurso politicamente correto diz que o ritual da malhação mimetiza a violência social e incita sua continuidade. Essa baboseira talvez só tenha paralelo na revisão de contos e canções infantis.

Mudar o enredo da fábula para que o lobo mau não coma a vovozinha não vai tornar a humanidade menos violenta, só reforça a inútil tentativa de escamotear essa característica.

Esse esforço, além de ser predestinado ao fracasso, é também nocivo, posto que se torna muito mais difícil enfrentar algo que não se quer reconhecer.

Parece que malhar o judas é mais do que uma diversão, a exemplo de outras celebrações populares. No Carnaval, cria-se um hiato para que as pessoas possam viver fantasias. Na malhação, simbolicamente é permitido definir um objeto para o ódio, que assim não se torna difuso, perigosamente sem foco.

Mas chega de tantas considerações. O que interessa mesmo é saber quem será o judas a ser malhado com satisfação nesse Sábado de Aleluia.

Não importa que o boneco não seja levado às ruas. Tanto faz se a opção for por um recatado, e talvez sensato, rito privado.

O que não pode faltar é a cerimônia da malhação, na qual se descarreguem todas aquelas pancadas economizadas até agora.

Eu já tenho a minha lista de candidatos a bonecos, mas ainda aceito sugestões.
Antonio Carlos de Faria é jornalista e vive no Rio de Janeiro. Escreve para a Folha Online às quintas

E-mail: acafaria@uol.com.br

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