Pensata

Antonio Carlos de Faria

26/06/2003

A galáxia de chuteiras

Em 17 de julho de 1994, enquanto o Brasil ganhava a sua quarta Copa do Mundo, a humanidade presenciou um dos maiores fenômenos astronômicos ocorridos em sua existência. Naquele dia, o cometa Shoemaker-Levy fazia um gol cósmico, atingindo em cheio o planeta Júpiter.

Já a seleção brasileira se consagrava campeã depois de o jogador italiano Baggio chutar um pênalti para longe do gol -um erro estelar.

Na ocasião, os brasileiros conquistaram o título por meio de jogos sofridos e arrastados, consagrando o estilo do técnico Parreira, que prefere sempre conduzir a partida para um empate e, quem sabe, ganhar a disputa num lance inesperado.

O gol do cometa havia sido previsto com um ano e meio de antecedência pelos cientistas. A trajetória obedeceu à inexorável matemática do universo. A precisão científica, paradoxalmente, não agregou nenhum centavo ao tesouro da auto-suficiência humana. Enfatizou, sim, sua fragilidade.

Restou a probabilidade sombria de que a própria Terra possa estar na rota de algum astro e que mesmo que isso seja descoberto com antecedência, nada poderá ser feito para evitar o impacto. A ciência aprendeu algo importante naquele 17 de julho.

Já Parreira parece não ter aprendido nada. A eliminação do Brasil na última segunda-feira, durante a Copa das Confederações, mostrou as mesmas deficiências que a seleção apresentara em 1994, principalmente na fase classificatória.

A seleção dirigida por Parreira não tem determinação de vencer. Se a vitória ocorre, vem como fruto de uma diligente timidez, que satura o adversário e o público, procurando se escorar em algum acaso, um lapso que salve esse estilo de jogo medroso. Mas nem sempre a salvação acontece.

Depois da derrota, é ainda mais vexaminoso ouvir que as causas do resultado foram a falta de preparação física ou de qualificação técnica dos jogadores. Tudo seria diferente se os jogadores fossem melhores, é o que diz o treinador.

Melhor do que atribuir o fracasso aos jogadores, seria analisar a conjunção dos astros. Dessa vez, a seleção foi desclassificada na França ao mesmo tempo em que a Terra e Marte vivem uma excepcional aproximação, fenômeno que não ocorria há 60 mil anos, época em que os homens ainda dividiam o planeta com o neandertais.

Não sei o que isso possa significar. Mas se é para responsabilizar alguém que não o próprio Parreira, que se busque justificativas na astronomia ou até na astrologia, menos culpar os jogadores, pois nitidamente executaram a coreografia ensinada pelo professor.
Antonio Carlos de Faria é jornalista e vive no Rio de Janeiro. Escreve para a Folha Online às quintas

E-mail: acafaria@uol.com.br

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