Pensata

Valdo Cruz

02/09/2008

Gilmar, o alvo

O esporte preferido ontem em Brasília era apontar uma versão para a autoria do grampo nos telefones do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Gilmar Mendes, e do senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Difícil, por enquanto, apontar qual delas a verdadeira, que iam da ação de um grupo dissidente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) até a compra dos trabalhos de um dos agentes do órgão por gente interessada em desqualificar investigações.

Seja qual for aquela que se mostrar procedente --e havia várias outras, como a montagem de uma gravação por parte dos próprios grampeados--, um fato é no mínimo intrigante. Um grupo dentro da Polícia Federal, não a cúpula, sempre cogitou que o presidente do Supremo, Gilmar Mendes, tinha uma atuação controversa. Esse grupo, em conversas reservadas, nunca escondeu que o ministro era um alvo a ser perseguido.

Recentemente, durante a Operação Navalha, agentes da PF fizeram circular a informação, de forma reservada, de que haviam pegado Gilmar Mendes envolvido em operações irregulares. Em Brasília é de conhecimento quase público que teve até gente comemorando dentro do órgão. Só que logo em seguida constatou-se que era um homônimo do presidente do STF.

Agora, na Operação Satiagraha, novamente o nome de Gilmar Mendes foi muito comentado pelos investigadores do caso chefiados pelo delegado Protógenes Queiroz. De novo foram lançadas suspeitas sobre a atuação do ministro, principalmente depois de ele conceder dois habeas corpus revogando a prisão do banqueiro Daniel Dantas, do grupo Opportunity. Provas, contudo, nunca foram encontradas contra Gilmar. Nem mesmo indícios.

Dentro do governo, há quem aponte o dedo para a equipe de Protógenes, lembrando que, à revelia de seus superiores, o delegado pediu ajuda a agentes da Abin para auxiliá-lo nas investigações. A mesma Abin agora apontada como responsável pelos grampos ilegais contra Gilmar Mendes. Porém, o simples fato de um grupo da PF lançar suspeitas sobre o ministro do Supremo não é prova de que dele partiu a ordem para fazer o grampo. Por enquanto, são apenas suspeitas. E isso não é suficiente para condenar ninguém, nem mesmo para sair por aí fazendo ações clandestinas.

Ou seja, se não há nada que deponha contra o presidente do STF, também nada pode ser apresentado como prova de que o delegado Protógenes estaria por trás do grampo como especulam alguns assessores governistas. Vai que se descobre que a versão verdadeira é a de que um agente da Abin foi cooptado por gente disposta a tumultuar as investigações da PF. Daí a importância de uma investigação profunda sobre a escuta clandestina. Até aqui, por sinal, esse é o único fato concreto de toda a história. Houve um grampo ilegal contra o chefe de um dos Poderes da República.

Valdo Cruz

Valdo Cruz é repórter especial da Folha. Foi diretor-executivo da Sucursal de Brasília durante os dois mandatos de FHC e no primeiro de Lula. Ocupou a secretaria de redação da sucursal. Escreve às terças.

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