Reuters
30/08/2002 - 15h45

Fome e miséria assombram crianças argentinas

da Reuters, em Formosa (Argentina)

Nos arredores de Formosa -a capital da Província homônima mais pobre da Argentina- inúmeras crianças nascem, crescem e morrem em meio à fome e à desnutrição.

Maltrapilhas, as crianças brincam descalças entre montanhas de lixo e fogem do calor tropical em casas improvisadas, algumas vezes tendo apenas um lençol como teto.

A cena se repete em cada um dos bairros que rodeiam a cidade que se tornou a capital argentina da miséria e onde, segundo dados oficiais, 31,5% de suas 71 mil crianças são pobres e 56,1% indigentes.

Com uma economia baseada no algodão e dizimada pela abertura econômica argentina nos últimos 25 anos, os chefes de família sobrevivem principalmente como empregados públicos de um governo provincial falido e acusado de desvio dos recursos destinados ao combate da pobreza.

Além de empregos públicos, os cidadãos pobres de Formosa sobrevivem de diferentes formas. Existem os que reviram o lixo em busca de objetos para vender ou de algum alimento, enquanto outros caçam animais para comer e alguns trabalham com artesanato.

"Preocupa-me esta deterioração humana... Observamos que a finalidade (da ajuda social) é bastante assistencialista e estimula um clientelismo político", disse o monsenhor José Conejero Gallego, autoridade máxima eclesiástica da região.

As diferenças sociais na Província de Formosa foram enfatizadas por um estudo do Ministério da Economia, mostrando que um trabalhador ganha em 53 anos o mesmo que um parlamentar provincial em um mês.

Entre os desfavorecidos está Patricia Palacios, uma mulher de apenas 29 anos, mas com semblante de idosa.

Com US$ 1 por dia para alimentar seus seis filhos, ela sobrevive em um dos assentamentos que rodeiam o bairro Eva Perón, a apenas oito quilômetros da casa do governo provincial.

Enquanto seus filhos correm pela casa de dois metros por três construída de papelão, Patricia pergunta-se por que seu bebê de um ano e três meses não cresce.

A criança desnutrida pesa apenas 6,6 quilos, menos que os 11 quilos de seu irmão gêmeo, que também teve uma alimentação ruim. "Não tenho como dar comida a eles", disse.

Fome
Em um dos bairro que rodeiam Eva Perón existe um pequeno centro assistencial infantil que atende apenas crianças desnutridas e foi aberto há dois meses após a morte de três bebês da região por desnutrição.

"Atendemos 46 crianças. Elas ficam aqui desde novinhos para podermos alimentá-las. Também damos apoio às mães", disse Patricia, a encarregada do Centro de Assistência Nutricional, criado por uma organização não-governamental e mantido com doações.

"Por enquanto estamos dando (às crianças e mães) leite de soja, porque não temos leite em pó ou de outro tipo", acrescentou Patricia.

A pequena Gloria Milagros chegou ao centro com três meses de vida, pesando 2,6 quilos. Sessenta dias depois engordou 1.700 gramas, mas os prejuízos possíveis de seu desenvolvimento mental por falta de alimentação podem ser irreparáveis.

"Estamos falando de uma taxa de desnutrição em Formosa de cerca de 34 a 40 crianças em cada mil. Isso significa que o sistema alimentar e nutricional da Província está quebrado", afirmou o nutricionista Juan Giuliano.

Segundo ele, os casos de desnutrição na região são do tipo crônico, o que significa que a estatura das crianças é inferior à media.

Giuliano acrescentou que a crise social também se evidencia no alto grau de deserção escolar -50% dos alunos- e no analfabetismo, de 9% cento contra a média nacional de 4,5%.

 

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