Reuters
09/09/2002 - 12h25

Católicos protestam contra premiação do Festival de Veneza

da Reuters, em Roma

Líderes da Igreja Católica criticaram hoje o Festival de Cinema de Veneza por ter concedido seu prêmio máximo a um filme britânico que mostra a crueldade e abusos cometidos numa instituição católica irlandesa.

O filme "The Magdalene Sisters", de Peter Mullan, ganhou o prestigioso prêmio Leão de Ouro na noite de ontem, numa decisão que enfureceu representantes da igreja que o qualificaram como propaganda anticatólica.

"Sinto enorme amargura. Isso não reflete bem para o Festival de Veneza", disse o cardeal Ersilio Tonini a jornalistas. "Não é um retrato fiel da igreja, e seu diretor fez afirmações caluniosas em relação a católicos."

O longa acompanha a vida de quatro jovens mulheres, supostamente promíscuas, que são mantidas presas em um dos asilos Magdalene da Irlanda, nos anos 60, obrigadas a trabalhar como escravas em lavanderias e sendo vítimas de maus-tratos nas mãos das freiras.

Baseado numa história verídica, o filme mostra que as garotas foram presas por motivos absurdos, tais como ter sido vítima de estupro ou ser "bonita demais".

A produção de Mullan surge num momento difícil para a Igreja Católica, que ainda não se recuperou dos escândalos gerados pelos casos de abuso sexual de crianças praticados por padres, que vieram à tona nos EUA. Líderes religiosos estão ansiosos por restaurar a sua imagem combalida.

A estréia mundial do filme foi bem recebida pelo público no Festival de Veneza, na semana passada, mas condenada imediatamente pelo jornal do Vaticano, o "L'Osservatore Romano", que qualificou o longa como "provocação rancorosa" que pinta um retrato equivocado da igreja.

Intolerância

O ator e diretor escocês Peter Mullan se defendeu das acusações, argumentando que seu longa é uma denúncia de todos os tipos de intolerância religiosa.

"Dizer que meu filme é um escândalo é absurdo", disse ele em coletiva de imprensa, ontem. "Não fui eu quem criou os asilos Magdalene, foram eles. Eu quis apenas expor uma das grandes injustiças da segunda metade do século 20."

Seus protestos não ajudaram a diminuir a polêmica criada num país em que a Igreja Católica continua tendo voz influente. Até mesmo alguns membros do júri do festival se distanciaram da decisão de premiar "The Magdalene Sisters".

"Quero uma explicação de como isso aconteceu. Minha oposição a isso é total, e não estou falando como católico. O filme de Mullan é propaganda negativa", disse Valerio Riva, um dos administradores do festival.

O prêmio foi aprovado pelo júri do festival, encabeçado pela atriz chinesa Gong Li, e a maioria dos grandes jornais italianos aplaudiu a escolha.

Nos meses que antecederam o maior evento do cinema na Itália, alguns integrantes do governo do premiê Silvio Berlusconi, de centro-direita, criticaram edições passadas do Festival de Veneza, dizendo que favoreceram ideologias de esquerda, e exigiram uma mudança.

Os jornais italianos disseram que a vitória de Peter Mullan mostra que o festival conseguiu manter sua independência e exortaram os católicos a assistir a "The Magdalene Sisters" com os espíritos abertos.

"Quem ataca o filme deveria lembrar que a mesma Igreja Católica criticou seus próprios erros sociais e que o papa pediu perdão por eles'', disse o jornal La Stampa num editorial de primeira página intitulado ``Onde está o escândalo?''.
 

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