Reuters
18/09/2002 - 21h10

Grammy Latino não deverá ser "empurrão" para o rap nacional

da Reuters, em São Paulo

O rap nacional é indicado pelo segundo ano consecutivo à premiação principal do Grammy Latino, deixando os grupos esperançosos por melhores chances tanto no mercado nacional quanto no mercado latino e norte-americano de hip hop.

Em 2001, Planet Hemp e Faces do Subúrbio disputaram o prêmio de melhor álbum de rap/hip hop. Desta vez, Nocaute e Camorra representam o Brasil nessa categoria com os álbuns "CD Pirata" e "Vírus", respectivamente.

Mas se os grupos se mostram otimistas em relação à indicação, produtores e críticos parecem descrentes de que a citação ou até mesmo a conquista da estatueta na cerimônia desta quarta-feira, em Los Angeles, acrescente alguma coisa ao gênero no Brasil.

"O Grammy é apenas uma articulação das gravadoras, embora levando em conta uma tendência mercadológica. Mas não vejo isso como uma maneira de aumentar o consumo de rap brasileiro fora do país", disse a jornalista Janaína Rocha, autora do livro-reportagem "Hip Hop -- A Periferia Grita" (Editora Perseu Abramo).

Carlos Eduardo Miranda, produtor da gravadora Trama, também considera difícil a exportação do rap brasileiro.

"Acho que a gente consome muito hip hop cubano, americano ou mexicano, mas não vejo outras comunidades consumindo o nosso rap", afirmou. "Até porque o nosso rap é muito baseado nas letras, que seriam de difícil compreensão em outros país."

Os especialistas acham que até mesmo no Brasil o rap ainda precisa percorrer um longo caminho para ser reconhecido por grandes gravadoras e por um público mais abrangente.

"Apesar de o rap sobreviver paralelamente à indústria, faltam alguns avanços para que ele se institucionalize. Os rappers precisam aprender a lidar melhor com o mercado e com o seu papel de possíveis educadores e conscientizadores políticos", afirmou Janaína.

"Ao mesmo tempo em que o rap brasileiro não pode perder seu caráter contestador e purista, com letras que retratam o caos social, ele precisa adicionar a isso a aceitação de que em algumas horas deve apenas entreter e de que não é preciso enxergar com maus olhos uma vertente mais pop", concluiu.

Anderson, do grupo Camorra, concorda em parte com Janaína. "Os rappers aqui ainda carregam muito essa coisa de que tem que ser gângster, tem que falar de arma e crime, e isso limita muito o movimento no Brasil", afirmou.

"Boa parte do movimento é tosco, faz trabalhos de má qualidade musical. Eles precisam melhorar muito musicalmente também'', comentou, concordando ainda que o rap pop não deveria ser mal visto. "A verdade é que todo mundo quer ser o Dr. Dre, o Jay Z, o Snoop Dogg", disse Anderson, referindo-se aos grandes nomes do hip hop dos EUA.

Apesar das críticas, Anderson enxerga uma possibilidade de crescimento do rap através do Grammy Latino - mesmo quando críticos como Janaína vêem as indicações como fruto do lobby das gravadoras Sony Music, no caso do Nocaute, e da própria Trama, responsável pelo Camorra, ainda que ambos os grupos estejam sem contratos no momento.

"Fomos escolhidos em meio a oito mil inscritos à premiação e sei que isso aconteceu por causa da nossa qualidade. E tenho certeza de que isso vai nos ajudar a fechar com uma outra gravadora para o lançamento do nosso próximo álbum, que está sendo produzido de maneira independente por enquanto", disse Anderson.

Cesar Belieny, baixista do Nocaute, também mostra otimismo em relação à festa latina. "Tudo é uma questão de oportunidade. A gente está sendo reconhecido pela indicação (...) as pessoas vão ficar curiosas para saber quem são esses caras", disse.

"Mais fácil é entrar no mercado latino. Mas eu vejo possibilidades de entrar no mercado norte-americano. Acho que nada é impossível depois da indicação", acrescentou.

O Nocaute foi formado em 1992 em Belford Roxo, no Rio de Janeiro, por Cesar Belieny (baixo), Ed Esteves (guitarra), Andréa Wolff (bateria), Nino Rap e Eddi MC (vocais). O grupo mistura rap com rock e ritmos brasileiros como o samba.

Já o Camorra saiu da zona norte de São Paulo há cinco anos com Anderson, Ney, Cleverson e o DJ Keffing. O CD "Vírus", que concorre ao prêmio, teve produção de João Marcelo Bôscoli.

A cerimônia do Grammy Latino acontece nesta quarta-feira no Kodak Theatre, em Hollywood, com transmissão ao vivo pelo SBT a partir das 22h.
 

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