Reuters
27/09/2002 - 15h13

Filme de Almodóvar abre Festival Rio BR em grande estilo

da Reuters, no Rio de Janeiro

O Festival Rio BR 2002 abriu a maratona cinematográfica deste ano em grande estilo na noite de ontem, no Cine Odeon, com a apresentação do aguardado filme do diretor espanhol Pedro Almodóvar, "Fale com Ela", muito aplaudido pela platéia de convidados que lotou o cinema.

Patrocinada pelo terceiro ano consecutivo pela BR Distribuidora, a mostra dá sinais de vigor e se posiciona entre os maiores festivais de cinema realizados no Brasil, atraindo um grande número de cinéfilos e atrações internacionais.

Antes mesmo de ser realizada a primeira sessão do evento, Walkiria Barbosa, uma das diretoras da mostra, comemorava a venda antecipada de 20 mil ingressos.

E, nas palavras de Ilda Santiago, também diretora do Rio BR 2002, o festival busca colocar a capital fluminense "na rota mundial dos grandes festivais cinematográficos, tornando-o uma referência na América Latina".

O novo filme do espanhol Almodóvar, que será lançado comercialmente pela Fox em novembro, agradou em cheio a platéia que acompanhou a projeção num silêncio quase religioso, encantada com as referências e reverências ao Brasil.

Entre elas, Elis Regina num tom dolorido cantando "Por Toda a Minha Vida" e Caetano Veloso se derramando em "Cucurrucucu Paloma" para uma pequena platéia extasiada, num concerto quase de câmara, acompanhado pelo violão de Pedro Sá e pelo violoncelo de Jacques Morelenbaum.

A escolha das músicas, enriquecida ainda pela pungente trilha assinada por Alberto Iglesias, é mais do que apropriada para embalar a história de amor de dois homens por duas mulheres, ambas internadas em estado de coma numa clínica espanhola.

A primeira e mais bela é Alicia (Leonor Watling), uma jovem bailarina, vítima de um acidente de carro num dia chuvoso. A segunda é a toureira Lydia (Rosario Flores), expressiva e sensual em seus trajes profissionais, que foi atingida por um touro durante uma apresentação.

O jornalista Marco (Darío Grandinetti), que estava iniciando uma difícil relação amorosa com Lydia, conhece Benigno (Javier Cámara) no hospital onde o rapaz trabalha como enfermeiro, contratado pelo pai de Alicia para cuidar da moça.

Benigno, cujo nome já é uma verdadeira declaração de Almodóvar sobre o que pensa do personagem e de suas ações, cuida da higiene da paciente, lhe faz massagens, corta seu cabelo, pinta suas unhas com um carinho enternecedor. E não deixa de "conversar" com ela enquanto cuida de seu corpo.

Benigno a trata como se a jovem pudesse compreender o que ele diz, preparando-a para o momento em que acordar de seu longo sono.

As conversas de Benigno com a bela adormecida intrigam Marco, abalado com o estado em que se encontra Lydia. A curiosidade acaba ajudando na aproximação de ambos, principalmente quando Benigno lhe diz que ele também precisa falar com Lydia, seguindo o seu exemplo.

Cético em relação à possibilidade de ela retornar do coma, Marco é incapaz de copiar seu modelo. Mas isso não impede que a amizade de ambos se fortaleça, criando suspeitas no espectador de que possa existir algum componente homossexual nessa aproximação, pelo menos da parte de Benigno.

Mas não interessa a Almodóvar aprofundar essa linha. Interessa ao diretor falar de amor e morte e de como é tênue a linha que separa os dois estados, ou como a solidão e a impossibilidade de amar leva as pessoas a se isolarem ou criarem um mundo paralelo.

Almodóvar consegue mais uma vez dar sólida consistência a tramas que aparentemente fogem da normalidade e as instala num universo à primeira vista insólito, mas que seu público já está habituado a frequentar.

Experimentalismo de Soderbergh

"Full Frontal", novo trabalho de Steven Soderbergh, também foi exibido no primeiro dia de sessões do Rio BR e se mostrou de um experimentalismo vaidoso.

Soderbergh mistura tudo: vídeo digital, imagens fora de foco e com luz estourada, auto-referências, filme dentro do filme (com David Fincher, diretor de "O Quarto do Pânico", numa ponta) e uma série de personagens falando de si mesmos e de suas próprias ocupações na vida real.

Um amontoado confuso que leva a crer que o que moveu Soderbergh desta vez foi um profundo e visceral exercício de vaidade -dele mesmo e de todos os envolvidos, como seus amigos atores Julia Roberts, Brad Pitt, Blair Underwood, Catherine Keener e David Duchovny.
 

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