Brasil precisa mostrar que é diferente da Argentina, diz Gros
DENISE LUNAda Reuters, no Rio de Janeiro
O desafio do Brasil hoje é mostrar que não compartilha dos mesmos problemas da Argentina, deixando claro que não haverá afrouxamento fiscal e que nem as eleições no próximo ano contaminarão o atual governo, na opinião do presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento e Econômico e Social).
``Temos que deixar claro que o vírus do populismo não vai contaminar o atual governo e nem o próximo'', disse à Reuters Francisco Gros, que está há um ano no cargo.
Nos últimos meses, o Brasil vem sofrendo com o efeito contágio do país vizinho, mergulhado há três anos em recessão e amaldiçoado por temores de moratória de sua dívida.
Gros acredita que as atenções terão que ser redobradas daqui para frente com a abertura da temporada política.
``Isso assusta muito o investidor, o próximo governo terá que manter a austeridade fiscal, a responsabilidade monetária e o compromisso com a inflação,'' disse ele.
Desde a sua crise cambial em janeiro de 1999, que resultou no regime de câmbio flutuante, o Brasil vem mantendo a inflação sob controle e assegurando superávits primários elevados graças à maior disciplina fiscal dos governos e estatais.
Mas os avanços obtidos nos últimos anos estariam comprometidos se o governo cedesse aos gastos sociais e de cunho eleitoreiro durante as campanhas para a escolha do sucessor de Fernando Henrique Cardoso.
Gros notou que a divulgação do pré-programa do PT, que em linhas gerais veio em tom mais moderado para o partido de esquerda e mais em linha com o compromisso com a estabilidade, foi um grande avanço e espera que ``outros caminhem para essa linha''.
Fundamentos mais sólidos
Flexibilidade cambial, maior rigidez fiscal e estabilidade política são os principais cartões de visita que diferenciam o Brasil da Argentina, avalia Gros.
``Pelo menos nas questões institucional, cambial e fiscal, a diferença entre os dois países é da água para o vinho'', compara.
A Argentina tem um sistema de câmbio fixo, elevados déficits fiscais e uma fraca coalizão política.
Segundo Gros, o Brasil também ``está bem na foto'' em relação à redução da atividade econômica que vem sendo observada em grandes potências como Estados Unidos, Japão e Europa.
``Evidente que estamos em um ano complicado, mas nesse quadro de redução do nível de atividade temos uma sinalização melhor do que o resto do mundo'', observa.
A economia brasileira deve crescer 2,8 por cento este ano, de acordo com a mais recente projeção do Banco Central. Em 2000, o crescimento foi de 4,46 por cento.
Ainda assim, na visão de Gros, o Brasil deve fazer uma ``blindagem preventiva'', que para economistas seria a renovação do acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o aumento do esforço fiscal.
Representantes do governo seguem para Washington nesta segunda-feira em meio a especulações que um novo acordo será negociado com o Fundo.
Investidores demonstram confiança
Gros acredita que os investidores já demonstraram maior confiança no Brasil. Prova disso, lembra, foi o sucesso da colocação das ações preferenciais da Petrobras, na semana passada, por um preço com pouco desconto em relação ao fechamento das ações nas bolsas de valores.
``Isso demonstrou a confiança no país, é uma boa companhia, mas está no Brasil'', disse Gros.
Ele esteve recentemente em Nova York e pôde constatar a admiração dos mercado financeiro com a reação dos brasileiros ao plano de racionamento, imposto em junho em resposta à grave crise de energia que o país atravessa.
Sem querer dar conselhos ou apontar caminhos para a solução dos problemas argentinos, Gros está otimista e torce para que o país encontre logo o caminho de saída para a crise.
Ele lembra que o Brasil já passou por problemas parecidos, nas crises asiática e russa, o que desencadeou a forte desvalorização da moeda há mais de dois anos.
``Previsões são sempre catastróficas. Em 1999 eu estava do lado de lá do balcão e só ouvia comentários de que o Brasil ia quebrar, é igual com a Argentina, mas não quebra não, isso é bobagem, é um exagero'', disse Gros, que no ano da desvalorização do real era executivo do Morgan Stanley, em Nova York.