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17/12/2002 - 02h57

Na França, religião pode voltar à escola

ALCINO LEITE NETO
da Folha de S.Paulo, em Paris

Deus pode voltar às salas de aula na França, país onde, desde o século passado, as escolas públicas foram proibidas de ensinar religião. O governo, de centro-direita, reuniu em novembro 300 pedagogos e professores para debater a questão.

O pensador Régis Debray, ex-guerrilheiro convertido ao catolicismo, autor do recente "Deus - um Itinerário", abriu o seminário. "Como compreender o 11 de setembro sem remontar ao wahhabismo (movimento islâmico), às diferentes filiações corânicas e aos avatares do monoteísmo? Como compreender o jazz e o pastor Luther King sem falar do protestantismo e da Bíblia?", escreveu Debray em seu relatório feito em março, para o então ministro Jack Lang.

O assunto é bastante polêmico na França, onde o princípio de laicidade, que mantém o Estado separado das igrejas, é quase um dogma. O presidente Jacques Chirac, que apóia a iniciativa, manifestou interesse por uma melhoria do ensino dos temas religiosos, mas dentro da escola laica. "É o fechamento em si mesmo e a ignorância que alimentam os preconceitos e os comunitarismos", disse ele num comunicado aos participantes do seminário.

O novo ministro da Educação, o filósofo Luc Ferry, ressaltou que o ensino das religiões, caso implantado no programa escolar, deverá ter por objetivo o esclarecimento, e nunca o esforço de conversão. Ele não deverá levar à criação de uma matéria específica, mas ao reforço dos assuntos religiosos em matérias variadas, como história e filosofia.

A prática será bastante difícil para os professores. Na escola pública, de confissão mista, os alunos muçulmanos são proibidos, por uma lei de 1989, de ostentar sinais religiosos, como o véu islâmico. A restrição foi abrandada com o tempo, e mesmo o ramadã passou a ser tolerado. Mas os professores reclamam de dificuldades para abordar os diferentes credos sem ferir a susceptibilidade dos alunos. Há ainda as complicações de expor os princípios religiosos com objetividade, sem aderir a nenhum deles ou condená-los.

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