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30/09/2003 - 02h56

Em 13 passos, saiba por onde se iniciar no mundo da ópera

JOÃO BATISTA NATALI
da Folha de S.Paulo

Não é preciso "entender" de ópera. Música erudita e canto não são "ciências" complicadas às quais só os especialistas têm acesso após muitos anos de estudo. A ópera é um objeto de prazer. Quando for assistir a uma delas pela primeira vez, deixe-se embalar e relaxe.

Como entender a história? As óperas são geralmente cantadas em italiano, em alemão e em russo. Antigamente, era necessário apenas chegar um pouco mais cedo ao teatro e ler no programa o enredo de cada ato. Mas, em 21 de janeiro de 1982, em Toronto, estreou um verdadeiro ovo de Colombo: o supertítulo, uma legenda com a tradução daquilo que os atores estão cantando. Ela é projetada numa tela horizontal e estreita, pendurada na parte de cima do palco.

CDs ou DVDs? Há coisa de 50 anos, gravações de óperas em 78 rpm eram caríssimas e exigiam, em média, 40 discos. As pessoas normalmente os alugavam para ouvir no domingo. Vieram os LPs, depois os CDs e, agora, as fitas de vídeo e o DVD. Com o DVD, se escolhe o idioma no qual a pessoa quer ler a legenda.

O que comprar em DVD? Se você for iniciante, comece pelo repertório mais conhecido. Uma "Tosca", de Puccini, com direção cênica de Zeffirelli e direção musical de Giuseppe Sinopoliccardo, no Met de Nova York, custa R$ 57. Um "O Ouro do Reino", de Wagner, regido em Bayreuth por Pierre Boulez, custa R$ 53. Uma "Traviata", de Verdi, com a soprano Angela Gheorghiu e a regência de Georg Solti, no Covent Garden, em Londres, custa R$ 56,50. Um "Don Giovanni", de Mozart, regido em Praga por Charles Mackerras, custa R$ 48. Deixe-se encantar aos poucos.

O que comprar em CD? Vale a mesma recomendação: caso se apaixone por Puccini ou Verdi, vá comprando aos poucos as óperas que eles escreveram. Faça o mesmo se a paixão for Richard Strauss ou Leos Janacek. O repertório é como um ambiente com muitas portas de entrada. Não é preciso começar pelo barroco (século 17 e primeira metade do 18) para, em seguida, ouvir o período clássico (segunda metade do século 18) e só então cair no romantismo (século 19).

Como escolher? Há certas armadilhas que é bom evitar. Não compre um DVD ou uma caixinha de CD porque a soprano da foto é bonita ou porque o principal papel masculino é interpretado por um dos três tenores (Pavarotti, Carreras e Domingo). Consulte um vendedor que entenda. Ou então dê uma espiada no anuário da "Gramophone" (algumas lojas o têm), publicação inglesa com uma resenha de todas as gravações. As opções são inúmeras. Em lojas de internet (ou de Berlim e Nova York), há 25 ou mais versões de, por exemplo, "As Bodas de Fígaro", de Mozart. É difícil encontrar uma gravação péssima. Mas procure ter algo entre o bom e o melhor.

O maestro é quem comanda o espetáculo. Ao assistir a um DVD, veja como os cantores sempre olham para as mãos do maestro, que dá os sinais de entrada e que apressa ou torna mais lentos os andamentos. O maestro rege a orquestra e os cantores. Os bons entendedores de ópera nunca dizem que a melhor versão da "Tosca" é "a do Pavarotti", que é um tenor. A melhor versão é sempre conhecida pelo nome do maestro.

Os cantores têm voz mais grave ou voz mais aguda. Há seis registros básicos de voz. Entre as mulheres, a voz mais aguda é a da soprano. A voz intermediária é a da mezzo-soprano (ou meio-soprano). E a voz mais grave é a da contralto. Entre os homens, na escala a partir da voz mais aguda, temos o tenor, o barítono e o baixo. Os compositores montam seus elencos com base nesses seis registros de voz. Na ópera italiana, o bandido ou o homem "do mal" é geralmente um baixo. E a heroína, claro, é sempre uma soprano.

Não chega a ser propriamente mentira que sopranos imortalizadas em certos papéis de heroínas eram donas de uma invejável massa corporal. Tinham, e ainda têm, uma imensa capacidade torácica, bastante útil para produzir grandes sons. E também é verdade que, para ser uma estrela conhecida do mundo lírico, é preciso estudar, no mínimo, de oito a dez anos e, em seguida, aceitar pequenos papéis que levem, depois de muitos anos, a papéis importantes e à consagração. Ou seja, uma artista madura tem por volta de 35 anos de idade. Se cuidar da voz, canta até os 60. Alguns críticos europeus e norte-americanos afirmam que a mulher mais bonita que subiu em todos os tipos de palco no século 20 foi a alemã Elizabeth Schwarzkopf, que, no final dos anos 40, foi, na Ópera de Chicago, a protagonista real de uma piadinha que corre até hoje. Ao vê-la entrar no palco, um crítico ficou boquiaberto. Quando ela passou a interpretar seu papel, o mesmo crítico balbuciou: "E ela até canta...!".

É no Theatro Municipal de São Paulo que são montadas óperas paulistanas desde 1911. O teatro tem corpos estáveis —ou seja, orquestra, coral e bailarinos próprios. O diretor musical escala os cantores para cada montagem. Para quem nunca foi, o teatro projetado por Ramos de Azevedo é maravilhoso. Há duas estréias ainda este ano: "Salomé", de Richard Strauss, em 24 de outubro, e "Os Contos de Hoffmann", de Jacques Offenbach, em 29 de novembro. Lembre-se: ópera não é coisa de rico —há ingressos a partir de R$ 15— nem exige que se vista smoking ou vestido longo. Existem também as vesperais líricas, com entrada gratuita.

O Teatro São Pedro (tel. 0/xx/11/ 3667-0499), na Barra Funda, em São Paulo, é um teatro menor, inaugurado em 1917 e reaberto, restauradíssimo, em 1998. Foi originariamente um teatro particular de opereta. Pertence, hoje, ao governo do Estado e é cedido para produções que exigem um número menor de cantores e de músicos da orquestra.

Procure eventos que expliquem didaticamente as óperas. Uma boa deixa: a Cultura Inglesa, em Pinheiros, zona oeste de São Paulo (tel. 0/xx/11/3039-0553), promove às 14h dos sábados, com entrada gratuita, vídeos e comentários com o historiador e crítico Lauro Machado Coelho, que já publicou cinco volumes de uma monumental "História da Ópera", pela editora Perspectiva.

O Centro Cultural Banco do Brasil, também em São Paulo, tem um auditório relativamente pequeno. Dá para montar ópera? Claro que dá. Tanto que, em julho, foi ali que se estreou "Anjo Negro", com música de João Guilherme Ripper, baseado no texto da peça homônima de Nelson Rodrigues, com direção musical de Abel Rocha. O Sesc Ipiranga, na capital paulista, também monta óperas de vez em quando. Trata-se de espetáculos conhecidos como ópera de bolso (ou "pocket operas"), porque não há um local abaixo do nível da platéia para acomodar os músicos, que, pouco numerosos, permanecem visíveis durante a apresentação.

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