Folha Online sinapse  
30/09/2003 - 03h22

Por que a escola é chata?

da Folha de S.Paulo

Os colunistas do Sinapse —Gilson Schwartz, 43, Gilberto Dimenstein, 46, e Rubem Alves, 69— abriram a "Semana Sinapse" com o tema "Por que a escola é chata?", que tratou de assuntos como a utilidade dos conteúdos ensinados em aula e a dificuldade para adquirir conhecimento.

Fabiano Cerchiari/Folha Imagem

A partir da esq., Gilson Schwartz, Gilberto Dimenstein e Rubem Alves, no primeiro dia da "Semana Sinapse"
Dimenstein abriu a palestra e afirmou que o principal problema da escola é o fato de ser desconectada do cotidiano dos alunos, preparando-os não para a vida, mas para provas.

O colunista da seção "Experimentar" disse também que "só se retêm informações que dêem prazer ou tenham utilidade" e que "a escola está se tornando não apenas chata mas também inútil". Para ele, isso acontece devido ao fluxo de informações em circulação. O conhecimento se torna obsoleto rapidamente e não é retido pela população.

Isso traz consequências ao mercado de trabalho, segundo o jornalista: "Agora, você é contratado mais pela atitude diante do conhecimento do que pelo conhecimento em si". Dimenstein sugere que, como cartões de crédito, diplomas tivessem prazo de validade e considera fundamental a educação permanente, que classifica de "quarto grau". "O ato de aprender é o ato de lidar diariamente com o prazer da descoberta."

Dimenstein considera possível encontrar salas de aula em diversos ambientes. "Dá para aprender matemática na marcenaria." Como exemplo, apresentou um vídeo sobre um projeto que realiza oficinas com grafiteiros e dá a eles a chance de apresentarem seus trabalhos ao mesmo tempo que revitalizam áreas degradadas.

Em resposta a Dimenstein —"antítese", como definiu—, o economista e sociólogo Gilson Schwartz afirmou que discorda da temática do debate de duas formas. De um lado, acha que pressupõe um juízo de valor. De outro, induz a crer que os estudos possam receber o tratamento de uma relação entre consumidor e objeto de desejo. Nesse sentido, considera até melhor que a escola seja chata.

Schwartz, que criticou a idéia de que é função das escolas qualificar para o mercado de trabalho, disse que há dois problemas na educação. O primeiro está ligado às emoções da idade. "É difícil convencer o aluno de ir à escola", afirmou o colunista da seção "Inteligências". O segundo é de ordem intelectual. "Produzir conhecimento é difícil. Dói. É 1% inspiração e 99% transpiração", afirmou. "Ler a 'Divina Comédia' é prazeroso, mas não se faz isso tão rapidamente quanto assistir a um filme."

Schwartz diz que escola não é parque de diversões, e que não há aprendizado espontâneo e indolor. "Para aprender matemática, também é preciso resolver problemas no papel, fora da marcenaria."

Propondo um debate consigo mesmo, Schwartz disse que, por outro lado, a escola não deve ser necessariamente chata. Para isso, ela deve cuidar para que, em aula, o aluno não seja desvinculado do contexto em que vive e que o colégio se aproxime da comunidade. "Quanto mais relevante for para o estudante, menos chata a escola será", disse. Mas ele advertiu para o fato de que a resposta de como fazer isso não é trivial.

Ao iniciar sua apresentação, o educador e psicanalista Rubem Alves fez uma ressalva à observação de Schwartz de que a escola não é um parque de diversões: "Há uma diferença entre ser interessante e ser divertido. Quanto mais interessante é a escola, mais disposta a sentir 'dor' a pessoa fica".

Em uma palestra cheia de citações e metáforas, o educador fez remissão ao sentido bíblico da palavra "conhecer" —ter relação sexual. "Para 'conhecer', é preciso estar excitado."

Alves acredita que a escola não precisaria ser chata. "A falha é querer ensinar o que a criança não quer aprender", disse, citando como exemplos dígrafos e orações subordinadas, assuntos que, segundo o educador, não têm nenhuma utilidade para os alunos.

O conhecimento, segundo o colunista da seção "Sabor do Saber", é como o crescimento físico. "Imagine uma cebola: o corpo está no meio, e o conhecimento vai-se acrescentando. A expansão do corpo excita porque é gostoso dominar o ambiente", afirmou.

O colunista considera fundamental ao indivíduo conhecer o espaço em que atua. Por isso, segundo ele, é fácil e interessante aprender aquilo com que se relaciona vitalmente.

Rubem Alves também criticou a divisão das atividades em aulas com tempo e assunto predeterminado. "O aluno tem 45 minutos para aprender português, 45 para matemática, 45 para história. Isso não é sofrimento, é burrice."

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