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02/12/2003
Café derrubou paredes
VICTOR RAMOS VIRGILIO ABRANCHES
da Equipe de Trainees
A riqueza gerada pelo ciclo do café, no final do século 19, trouxe para São Paulo a cultura que confunde o progresso com a necessidade de destruir o antigo para construir o novo. Para historiadores e arquitetos, um processo que pautou o crescimento da cidade.
No centro, esse movimento foi nítido. Um exemplo é a Sé. Antes da atual, existiram outras duas igrejas no mesmo local. A primeira foi erguida no século 16, mas derrubada no século 18, para a construção de uma catedral. Essa, no entanto, foi demolida em 1911, quando se começou a erguer o prédio que existe até hoje.
"Na verdade, os velhos edifícios coloniais estavam sendo vistos como pobres e feios. Queriam demolir os velhos sobrados, as velhas igrejas", afirma o professor Nestor Goulart Reis, sociólogo e titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.
O desenvolvimento econômico exigiu que a cidade se estruturasse para o progresso. "Foi preciso alargar a cidade, criar bairros, abrir avenidas e destruir o velho para fazer o novo. O café introduziu essa fé, que vem até hoje", diz o historiador Hernani Donato.
A dinâmica se enraizou no desenvolvimento da cidade, influenciando em todos os momentos.
São os casos do vale do Anhangabaú, que já passou por diversas intervenções e não se assemelha mais ao que era originalmente, e da avenida Paulista, que teve a maioria de seus casarões derrubada --apenas sete resistem, preservados ou adaptados como empresas de serviços e comércio.
Sobreviventes do processo paulistano de substituição do antigo pelo novo são os prédios do arquiteto Ramos de Azevedo, como o Palácio da Justiça e o edifício Caetano de Campos, hoje sede da Secretaria Estadual da Educação.
Mas, conta a historiadora e museóloga Maria Aparecida Lomônaco, só as construções oficiais do arquiteto resistiram. "Na parte oficial, ele construiu os elementos essenciais para a constituição de uma grande cidade. Mas também construiu edifícios residenciais. Com o crescimento da cidade, quase todos desapareceram."
Além do caso de Ramos de Azevedo, nota-se, nos últimos anos, um aumento da consciência pela manutenção do patrimônio.
Lomônaco explica que isso se deve à criação, a partir da década de 60, dos órgãos de preservação, tanto no âmbito estadual como no municipal.
Mais recentemente, destaca-se a atuação de algumas associações de bairros organizadas pelos moradores na defesa do espaço público, como é o caso da Saúde e do Bexiga.
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