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Educação
24/06/2005

Criar políticas de longo prazo e dar continuidade por muitas gestões

RODRIGO RÖTZSCH
Da equipe de trainees

Leo Drumond/Equipe de trainees
Sala de aula em Lençóis (BA), um dos 30 municípios beneficiados hoje pelo Projeto Chapada, criado há seis anos
Sala de aula em Lençóis (BA), um dos 30 municípios beneficiados hoje pelo Projeto Chapada, criado há seis anos
Se na educação não há solu­ções mágicas para melho­rá-la da noite para o dia, há sim uma palavra mágica citada por 15 dos 23 especialistas ouvi­dos pela Folha para sanar os problemas do setor: continuidade.

O relatório global do programa Educação para Todos, da Unesco, aponta a continuidade das políticas educacionais, imunes às mu­danças de governo, como fator que une quatro países de alta per­formance no setor --Cuba, Cana­dá, Coréia do Sul e Finlândia.

O mesmo relatório aponta a quase universalização do acesso ao ensino fundamental no Brasil como fruto da continuidade das políticas educacionais durante os anos 90 no país, o que pode ser li­gado à permanência de um mes­mo ministro da Educação por oi­to anos (1995-2002). Paulo Renato Souza foi o único ministro a ficar no cargo durante todo o man­dato de um presidente eleito de­mocraticamente --Fernando Henrique Cardoso. Entre os go­vernos Fernando Collor e Itamar Franco, por exemplo, quatro mi­nistros passaram pela pasta.

No governo Lula, em menos de três anos, já houve troca no mi­nistério. Tarso Genro substituiu Cristovam Buarque em janeiro do ano passado. Para Tarso, porém, a continuidade de políticas não depende da permanência de mi­nistros, mas do tratamento da educação como "política, não de um governo, mas de Estado" (leia entrevista na página 11).

Apesar de ter conduzido o pro­cesso que elevou o índice de crianças na escola de 86,4% em 1990 para 97,2% em 2003, Paulo Renato não conseguiu dar quali­dade ao ensino. Em 2003, o Brasil ficou em 37º lugar entre 40 países em compreensão de leitura e últi­mo em matemática no Pisa, pro­grama de avaliação da OCDE .

O ex-ministro defende a conti­nuidade das suas políticas. "Essas medidas têm que ter continuidade para produzir resultado ao longo dos anos. O resultado não aparece instantaneamente."

O consultor em educação João Batista Oliveira diz que é preciso traçar metas prioritárias e cumpri-las, lembrando o exemplo dos principais países europeus, que deram qualidade aos níveis inferiores para depois investir nos su­periores. Oliveira diz que "o Brasil não tem paciência, quer trocar a roda com o carro andando". Para ele, é preciso um plano de 30 anos.

Um plano com pretensões de longo prazo já existe em forma de lei: o Plano Nacional de Educação, de 2001, que traça metas até 2011. No entanto, quatro anos de­pois da sua promulgação, a maio­ria dessas metas não estão sendo cumpridas, como as de reduzir os índices de evasão e repetência. No ensino médio, os índices não só não caíram, como cresceram en­tre 2002 e 2003 (leia nesta página).

A diretora da Faculdade de Educação da USP, Selma Pimenta, diz que educação é um process­o que não se resolve em apenas quatro anos. "As políticas têm que ultrapassar o período de um governo, os governantes tinham que ter mais humildade e não fa­zer foguetório com a educação."

Opiniões estrangeiras

Para especialistas internacio­nais, o Brasil precisa mudar a ma­neira de pensar a educação. O presidente da Associação Inter­nacional da História da Educação, António Nóvoa, observador da educação brasileira, diz que o país passa a sensação de "que se está a inventar o mundo todos os dias".

O argentino Jorge Werthein, re­presentante da Unesco no Brasil, afirma que a educação não é vista como prioritária, mas apenas im­portante. Ele diz que é preciso ter uma política educacional a longo prazo para que experiências bem-sucedidas, porém isoladas, tor­nem-se práticas habituais.

Uma dessas experiências acon­teceu em Santo Amaro da Impe­ratriz, município de 15 mil habitantes da Grande Florianópolis (SC). Entre 1991 e 2000, a cidade subiu do 676º para o 1º lugar em Índice de Desenvolvimento Hu­mano Municipal/Educação do Brasil, que combina as taxas de alfabetização de adultos e de matrí­cula nos três níveis de ensino.

O avanço foi fruto de um programa implementado em 1993 com o objetivo de não deixar ne­nhuma criança fora da escola e mantido por três gestões de parti­dos diferentes (PMDB e PTB).

Na Chapada Diamantina (BA), o Projeto Chapada, que mais que dobrou a alfabetização na região, foi assumido como compromisso por candidatos à prefeitura de 12 cidades baianas (leia na página 5).

Ter metas de longo prazo não significa esquecer a situação ime­diata, segundo entrevistados. Selma Pimenta diz que "não dá para planejar só pensando em melho­rar daqui a 20 anos, ou haverá mais uma dívida histórica".

Para Jorge Werthein, longo e curto prazo caminham juntos. "Se se toma a decisão política de que a educação é prioritária, o im­pacto aparece no curtíssimo pra­zo, pois os governantes passam a priorizar esforços e recursos."

O ex-ministro Cristovam Buarque não vê solução para o dilema. "A educação precisa de uma revolução. Para fazer uma revolução, é preciso fazer por inteiro. Na horade fazer Itaipu, não se perguntou se devíamos fazer a represa ou as turbinas. Temos que tratar educa­ção como tratamos hidrelétricas, com princípio, meio e fim."

Leia o relatório da Unesco em www.efareport.unesco.org
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