São Paulo, sábado, 13 de outubro de 2001
 

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Adoções por casal branco predominam

FABIO GUIMARÃES ROLIM
DA EQUIPE DE TRAINEES

De cada 100 mulheres que fazem adoção formal, somente 3 são negras. Em relação aos homens, 14 são negros a cada 100.
Os dados foram obtidos pela psicóloga e professora Lídia Weber, da UFPR (Universidade Federal do Paraná), que pesquisou 311 famílias adotivas espalhadas por 105 cidades brasileiras.
Pelo levantamento, 96,2% das mães são brancas, 3,1% são pardas, e 0,2% são pretas. Entre os pais, 85,5% são brancos, 12,8% são pardos, e 1,2%, pretos.
Há menos negros adotando que crianças negras sendo adotadas, o que indica que parte das crianças negras estejam sendo tiradas dos orfanatos por pais brancos.
Para Lídia, a pequena presença de pais negros nos números das adoções pode ser explicada pela marginalização social e econômica desse segmento da população.
Paulo Sérgio dos Santos, 41, presidente do Angaad (Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção), acredita que a marginalização não deveria ser considerada pelos negros como um obstáculo à adoção.
"Se a comunidade negra buscasse fortalecer a proposta e a levasse adiante, muitos problemas poderiam ser minimizados", diz ele, que é filho adotivo.
Roberto da Silva, 42, pedagogo e autor do livro "Filhos do Governo", sobre internos da Febem, concorda e afirma que o principal na adoção das crianças é a disponibilidade de afeto e não de dinheiro. Segundo ele, os movimentos negros deveriam se unir em torno da questão da adoção.
"Se os negros querem espaço na universidade e no mercado de trabalho, por que não tratar questões como adoção e abandono infantil na perspectiva de uma questão étnica?", pergunta Silva.
Representantes de movimentos negros discordam. Para Sueli Carneiro, 51, presidente da ONG Geledés - Instituto da Mulher Negra, os negros têm a adoção incorporada em sua estrutura familiar de uma maneira informal.
Ela cita as famílias negras às quais se agregam frequentemente crianças de outras famílias. "A família burguesa nuclear ainda é um modelo distante da maioria da nossa população", diz Sueli.
Ivanir dos Santos, 47, que se considera "afrodescendente" e é presidente do Ceap (Centro de Articulação de Populações Marginalizadas), concorda com Sueli. Para ele, as adoções informais são muito comuns não só entre as comunidades negras, mas também em outras camadas mais pobres da sociedade brasileira.
Ivanir acredita que, nos casos de adoção formal, existe preferência por crianças brancas e que isso serve para desmistificar a democracia racial do Brasil.
"Se o dado de raça e cor não fosse importante, as pessoas adotariam crianças negras, pois são as que mais precisam de ajuda", afirma o presidente do Ceap.

Crianças do Sul
A pesquisadora Lídia Weber também fez um levantamento em Curitiba, entre 1990 e 1995, que mostrou que 75% das crianças disponíveis eram adotadas por casais dos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo. A escolha pelo sul do país para adoção, segundo ela, fundamenta-se numa esperança de encontrar mais crianças brancas disponíveis para adoção do que em outros Estados.
Santos, do Angaad, considera "restritivo" o perfil determinado pelo adotante brasileiro. Para ele, o processo de adoção é lento não por morosidade da Justiça, mas porque os pais exigem que as crianças sejam brancas.
Lídia concorda. "Existem pessoas que estão há mais de dois anos na fila só porque querem um bebê com até três meses, menina e branca. Alguns preferem nem adotar", conta a psicóloga.


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