Palco do AI-5 não envelheceu nem um só dia em quatro décadas

Na noite de 13 de dezembro de 1968, a biblioteca do Palácio Laranjeiras foi invadida pelo som das sirenes de viaturas policiais que protegiam a 43ª reunião do CSN (Conselho de Segurança Nacional). Quarenta anos depois do encontro que editou o AI-5, o único barulho que se escuta no mesmo cômodo é o canto de pardais, pousados nas três varandas da sala. Atualmente, o palácio está fechado para visitação e as únicas pessoas que encostam nas poltronas verde-água da sala de 80 m² iluminada por quatro portas-janela são faxineiras.

Se depender do governo do Estado do Rio de Janeiro, o gorjeio será substituído pelo barulho de furadeiras em breve: o órgão fez um plano de reforma de R$ 15 milhões para "modernização" do palácio.

Paula Huven/Folha Imagem

Fachada do Palácio Laranjeiras, no Rio de Janeiro

Mas o barulho da reforma do telhado (com infiltrações) e da instalação de aparelhos de ar-condicionado embutidos não deve perturbar a rotina de leitura da casa. O hábito de usar a biblioteca para ler não existe, contaram ex-moradores do imóvel à Folha.

Silêncio

Paula Huven/Folha Imagem

Mesa em que houve a reunião do Ai-5, na biblioteca

O atual governador do Rio, Sérgio Cabral, usa o Laranjeiras como escritório oficial de despacho. Mas fica no escritório, e entra no cômodo raras vezes.

Entre 1987 e 1991, na gestão do ex-governador Wellington Moreira Franco, a biblioteca teve dois usos. Era lá que os dignitários em visita ao Laranjeiras recebiam presentes e onde se realizavam algumas reuniões importantes. Como a em que Fidel Castro ouviu de um empresário que só não aplicou a política de congelamento de poupanças (então empregada pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello) em Cuba porque lhe faltava coragem, conta.

Governadora por seis meses em 2002, Benedita da Silva diz lamentar não ter tido tempo de aproveitar a sala. Benedita afirma que o cômodo é "cheio de energias". Se a quantidade de energia residual é grande, não se pode dizer o mesmo do número de livros.

Das 55 prateleiras componentes dos 11 armários que cobrem as paredes da sala, 29 estão vazias. Onde existem, os livros estão organizados, limpos e catalogados. O piso de madeira encaixada em parquê original da biblioteca, instalado entre 1909 e 1913, quando a casa foi construída, ainda é o mesmo. Já a mesa usada na reunião não está mais lá.

O móvel de imbúia preta, feito para acomodar 20, mas que acomodou 24 na reunião do dia 13, foi levado para a o salão principal, no andar de baixo. Quem senta em uma de suas pontas dá de frente para uma tela a óleo do pintor francês Taunay, com o sugestivo nome "A União Faz a Força".