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Vícios modernos
20/06/2004

Íntegra: Na internet, caminhos mais viciantes são os interativos

Para a psicóloga Luciana Nunes, os caminhos mais viciantes na internet são os interativos: chats, blogs, sexo virtual. Entre os sintomas de um dependente, estão a necessidade crescente de tempo on-line e o abandono de atividades sociais e profissionais para ficar em frente à tela. Lucina usa a psicoterapia breve para tratar pacientes com distúrbios relacionados à internet e coordena o site www.psicoinfo.com.br, que dá orientações para dependentes e familiares

Folha - A dependência de internet pode ser considerada um vício?

Luciana Nunes - Pode. O paralelo é com o jogo, que não envolve uma substância. Na verdade é um transtorno.

Folha - E a dependência é fisiológica ou só psicológica?

Nunes - Nunca é um fator só, biológico ou psicológico. Existe fator biológico, uma predisposição genética, mas o que desengatilha tudo isso são fatores psicológicos. Se a pessoas tem estrutura psicológica e consegue passar por essa predisposição genética, não vai nunca ter dependência. Mas existe sim o fator orgânico, que envolve mecanismos sinápticos. Uma teoria de que algumas pessoas são pré-dispostas a desenvolver o transtorno.

Folha - Existem caminhos mais viciantes na internet?

Nunes - Não sei se são os caminhos mais viciantes, mas são os caminhos que causam maior dependência. E, se for pensar, são os caminhos mais interativos. Não é à toa que os ambientes de pessoas com TDI (Transtorno de Dependência a Internet) estão localizados nos chats e nos MUDs (tipo blog). Existe uma grande ligação entre cyber sexy e dependência online. Nada excita mais do que sexo. E está relacionado ao romance. Existe paralelo grande entre cyber sexo e dependência.

Folha - Existem pessoas com perfis mais propensos a se viciar?

Nunes - Tem o fator biológico e também da personalidade da pessoa. Uma forma de ambiente. Quando a pessoa começa a utilizar a internet como forma de escapar dos problemas pessoais: da solidão, da depressão. Utiliza internet para escapar de problemas presenciais. Você opta pelo prazer. Se a pessoa já tem uma prredisposição genética, essa exposição ao prazer cria essa dependência. Uma coisa é ser dependene de álcool, jogo, sexo, não importa, a base é a mesma. É uma personalidade de dependência --sem isso eu não vivo, sem isso eu não sou-- e existe a dependêcnia orgânica, isso me gera o prazer. É importante frisar que existem os sintomas de abstinência.

Folha - E quais seriam esses sintomas?

Nunes - Se fica fora da internet por dias ou semanas e apresenta irritabilidade, constância no pensamento sobre a internet (um pensamento recorrente de preciso voltar, preciso checar os e-mails). Também incluem tremor, irritabilidade. Se não houver isso, não existe dependência. Existe uma grande vontade ou afinidade em acessar. Prejuízo pessoal, social e profissional. A pergunta é: está só naquilo ou sobra tempo para a vida dele? Um dos primeiros passos é admitir que tem a dependência.

Folha - Como se reconhece um dependente?

Nunes - São sete critérios diagnósticos, a pessoa tem de apresentar três por pelo menos um ano. A partir daí caracteriza-se um transtorno de dependência de internet. Seis meses está curtindo, sei lá, conhecendo.

Folha - E quais seriam esses critérios?

Nunes - Tolerância (nunca o tempo da internet é suficiente), sintomas de abstinência, utilizar a internet como forma de escapar de problemas que estão acontecendo dentro de casa (teve uma briga e corre para lá), ficar na internet mais tempo do que gostaria. Aumento significativo das atividades online (o mundo parece só funcionar através da internet --faz compras de supermercado, compra livros, lê e-books, compra ticket de cinema-- como se o mundo inteiro girasse em torno desse meio). Redução das atividades prazerosas em função da internet e comprometimento profissional, pessoal e das atividades em função da internet.

Folha - Como seriam os casos extremos?

Nunes - Uma vez atendi um rapaz que chegava a babar, a travar os dentes porque queria usar a internet e estava impedido de usar. Além dos efeitos de abstinência tinha a agressividade.

Folha - Como é o tratamento?

Nunes - Diminuir o tempo. Fala em redução quando percebe que existe uma propensão à dependência ou ao uso patológico. Que existe um prejuízo profissional, social e afetivo em relação ao abuso da internet. Pedimos para diminuir e reconhecer os sintomas. O reconhecimento dos sintomas é o primeiro passo.

A população, em geral, faz uso moderado. Continua a sair com os amigos, mantém a amizade, a namorada.

Folha - Como se reconhece o limite entre a dependência e o uso abusivo?

Nunes - O importante não é o tempo de acesso. A diferença é que quando a pessoa entra para ver um e-mail --e, facilmente, em uma hora limparia toda sua caixa-- e passa uma tarde inteira conectada. Tem a intenção de ficar um tempo e fica um outro completamente diferente.

Folha - Quais são as principais dificuldades no tratamento?

Nunes - Primeiro é se acreditar que isso possa existir. Existe uma diferença de gerações, que é tecnológica e não de idades. Uma é extremamente informatizada e outra não acessível a essa informação da informática. É muito mais fácil deixar seu filho no computador. E a criança vai criando um mundo em que cada vez mais existe essa distância. Já que exite essa distância entre mundos, como se reconhecer o que é normal e o que é patológico? Aparecem crianças com tendinite, lesão por esforço repetitivo e os pais não percebem, não se dão conta. Como vão identificar aquilo se nunca passaram por isso? Nunca tiveram olhos para poder ver. Mas tudo o que é patológico é minoria. A maioria utiliza a internet de forma saudável, interativa, informativa e de conhecimento também. Tudo é uma questão de moderação, mas primeiro é preciso saber o que reconhecer. Seu filho estar muito na internet é sinal de dependência? Não, pode estar só namorando.

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