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MINICONTO Quem pega o quê Paulo Bentancur João, Raul e Antônio desceram a rua faceiros. Espiando cada coisa e a pegando, em pensamento. O bairro, distraído, achava-se dono de si. Cada cão era sem dono, (por ser de um desconhecido); tantas bikes esquecidas, jardins, gente, bolas, tanto que os olhos ao as tocarem não podiam resistir. Qualquer um há de querer com gula, com sede fatias da realidade que a fantasia resolve morder, beber (ou pensar). "Esta, azul, é minha!", disse Raul a uma casa. João se decepcionou, mas reagiu de imediato: "Este é meu, é meu, é meu", declarou diante de um carro reluzente e seus pneus. Antônio, inconformado, viu Letícia com a mãe, numa loja envidraçada, onde compravam pinturas e roupas. Uma, anéis; outra com sua sainha. "Essa garota é minha!", declarou aos dois amigos e beijou à distância. João e Raul só murcharam. Tinham chegado atrasados na hora da melhor escolha. Um não ia pegar chuva, protegido na casa. O outro não se atrasaria, voando no carro novo. Já, Antônio, seu tesouro, deu-lhe o calor da escolha de João e a vertigem da escolha de Raul mas o coração, só de um: de Antônio, o encantado, que, sem pressa ou ambição, escolheu ser namorado. Sobre o autor Paulo Bentancur é escritor, autor de "A Máquina de Brincar", "As Rimas da Rita" e "O Olhar das Palavras", todos publicados pela editora Bertrand Brasil. Texto Anterior | Próximo Texto | Índice |
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