São Paulo, sábado, 8 de janeiro de 1994
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O futebol na ordem do dia, do PC ao cult

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

Meus amigos, meus inimigos, mencionei aqui nesta coluna que o politicamente correto, que domina o debate cultural norte-americano, poderia beneficiar o futebol nos EUA.
Com a afirmação cultural de negros e latinos, o futebol poderia também entrar na maré geral da segmentação cultural e conquistar o seu espaçozinho no maior mercado do mundo.
O PC, na verdade, é uma regressão cultural. E a seleção brasileira vai estar bem pertinho dele. No campus da universidade de Stanford, na Califórnia, onde está o campo em que o Brasil jogará as suas primeiras partidas, disputa-se a liderança das posições PCs.
O crítico de arte da revista "Time", Robert Hughes, um australiano que vive nos EUA, no seu polêmico livrinho que a Companhia das Letras lançou recentemente, "Cultura da Reclamação" –na verdade um torpedo, digno de um Roberto Cavalo, contra o PC–, menciona algumas das barbaridades que o movimento comete na Califórnia.
Mas, Hughes vai mais longe. Ele mostra que o PC já atingiu o esporte. Segundo ele, o "Whatizit" (traduzido por "Queéisso"), o símbolo oficial dos Jogos Olímpicos de 1996, em Atlanta, nos EUA, não passa de um feto.
"Será que isso prenuncia uma onda de Fetus Chic para 1996?", ele pergunta. Na origem da escolha do Whatizit estaria o chamado movimento pró-defesa da vida, uma espécie de "politicamente correto" do lado conservador.
Hughes: "Só nos EUA poderia um feto passar com tanta rapidez de símbolo de uma 'guerra cultural' a logotipo de um acontecimento esportivo. Whatizit é um lembrete bonitinho de uma questão nem um pouco bonitinha. É por isso que Whatizit vai se tornar bastante importuno à medida que se aproximarem as Olimpíadas, e gratuitamente incômodo".
A América, como dizia Miles Davis, é um país maravilhoso onde você pode reunir mil vozes para gravar um uníssono. Poucos países, na história contemporânea, conseguem armar uma infra-estrutura perfeita para sediar, com intervalo de dois anos, os dois maiores eventos da indústria do entretenimento, a Copa do Mundo de Futebol e as Olimpíadas.
Mas que a terra do tio Dave tem suas esquisitices, isto tem. E que –mesmo depois do final da Guerra Fria– o esporte terá ainda que passar pelas tensões políticas da Nova Desordem Mundial, disto também não resta a menor dúvida.
O fut e a futilidade
O fut entra em 1994 como um dos queridos do mundinho da mundanidade. O fut virou cult. O último número da revista britânica "The Face", por exemplo, situa na coluna "Up" o corte de cabelo dos jogadores de futebol.
Já a "Details" de janeiro traz uma excelente reportagem do também britânico Chris Heath –cujo principal destaque no futebol foi ajudar a equipe de suporte das excursões do grupo The Cure a encontrar seus jogadores– sobre John Harkes, o jogador da seleção dos EUA que conseguiu se destacar no campeonato inglês (é o único americano que marcou um gol no estádio de Wembley).
Entre outras coisas, ele revela uma grande dificuldade para o "soccer" se implantar nos EUA: em quase todos os lugares onde é forte, o futebol é um esporte amado pela massa de proletários e pobres. Os EUA querem que, lá, ele seja um jogo que entre na mesma fatia dos apreciadores do tênis. Acho que não vai dar certo.

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