São Paulo, domingo, 9 de janeiro de 1994
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Bancos lucram US$ 17 bi com inflação

NILTON HORITA
DA REPORTAGEM LOCAL

Cada centavo parado no bolso das calças ou depositado na conta corrente representou uma receita adicional de US$ 17 bilhões para o sistema financeiro brasileiro, em 1993. O Banco Central ficou com a parte do leão, ou seja, US$ 14 bilhões, enquanto os bancos oficiais e privados racharam outros US$ 3 bilhões. Esta é a dimensão da acumulação de riqueza provocada pela inflação.
O volume de dinheiro é expressivo. Seria suficiente para eliminar 80% da dor de cabeça do ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso. O corte de gastos que o governo negocia com a classe política é de US$ 22 bilhões.
Se a inflação se mantiver na casa dos 40% mensais, esse lucro terá espaço para crescer ainda mais. A projeção aponta para uma transferência de US$ 24 bilhões ao governo e de outros US$ 4,3 bilhões para o sistema bancário.
O governo, segundo Ibrahim Eris, ex-presidente do BC, usa esse dinheiro para financiar parte do seu déficit. O BC estabelece uma sociedade com a inflação ao exercer sua responsabilidade de emissor do dinheiro que circula na economia.
Imagine que há US$ 1 milhão girando na economia. O dinheiro, porém, é expresso em cruzeiros reais, um artigo considerado de segunda classe por perder 1% do seu valor todos os dias. Esse estoque de US$ 1 milhão é representado por, digamos, CR$ 350 bilhões. Depois de 30 dias, aquele estoque de US$ 1 milhão ficou equivalente a apenas CR$ 210 bilhões.
O BC ganha, então, a possibilidade de emitir os CR$ 140 bilhões que faltam para repor o estoque original de US$ 1 milhão. "O lucro é depois transferido para o Tesouro Nacional, que acaba se financiando com esse dinheiro", explica Eris.
Os bancos, por sua vez, ganham seu quinhão ao administrar os depósitos em conta corrente que não são recolhidos pelo BC. Esse dinheiro pode ser emprestado ou aplicado pelo banco, o que multiplica o seu valor.
Segundo Paulo Mallmann, diretor-financeiro do Banco BMC, economias com inflação baixa também convivem com o fenômeno. "Neste caso, porém, não existe uma relação deturpada. A sociedade paga esse imposto de bom grado, pois recebe em troca uma moeda de boa qualidade, que lhe presta serviços e permite melhora nas condições de vida."
O governo e o sistema financeiro são sócios da inflação e ganham bem. Mas engana-se quem pensa que o fim da inflação significa a falência dos bancos. Uma das leis imutáveis do capitalismo diz que o banco nunca perde. "Sabemos nos adaptar rapidamente às mais diferentes situações", afirma Walter Kuroda, diretor de planejamento do Banco Nacional.

LEIA MAIS
sobre o lucro com a inflação na pág. 2-3

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