São Paulo, terça-feira, 11 de janeiro de 1994
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Brasileiros dominam a soja do Paraguai

JOSÉ MASCHIO
ENVIADO ESPECIAL A ASSUNÇÃO

Os sojicultores brasileiros invadiram o Paraguai. Mais de 80% da produção paraguaia de soja (estimada em 2,1 milhões de toneladas de grãos nesta safra de verão) será colhida por fazendeiros "brasiguaios", que conseguiram realizar o sonho do "eldorado" do outro lado do rio Paraná e não pensam mais em retornar ao Brasil. A perspectiva de crescimento econômico e a terra barata são os principais atrativos.
Representando quase 10% da população paraguaia (de 4,3 milhões de habitantes), os brasileiros formam uma quase extensão do território do Brasil nos departamentos (Estados) de Alto Paraná, Canindeyú e, em menor escala, Itapúa. São cerca de 400 mil brasileiros que levaram a tecnologia de produção de soja adquirida nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.
O gaúcho João Lopes de Matos, 37, é um dos "brasiguaios" que conquistaram estabilidade econômica no país vizinho. Ex-trabalhador de granjas em Lagoa Vermelha (RS) e em Toledo (PR), Matos chegou desempregado há 13 anos ao Paraguai para visitar um amigo. "Vim só com uma mala, sem dinheiro, e acabei empregado como tratorista", diz.
Com o que ganhou na colheita, Matos conseguiu comprar o "primeiro pedaço de chão da vida". Ele só voltou ao Brasil para casar. Hoje, com três filhos nascidos no Paraguai, ele diz que só retorna ao Brasil para ver parentes. Em 13 anos no Paraguai, Matos conseguiu ser proprietário de 33 hectares, onde planta soja e trigo, além de um caminhão, trator, colheitadeira e automóvel.
Edson Presa, 44, de Medianeira (PR) é outro brasiguaio bem-sucedido. Agenciador da Amcorp (American Corporation) no contato com os produtores, Presa ganha em média CR$ 30 milhões por safra. Proprietário de 35 hectares, ele chegou a comprar uma casa em Medianeira em 1992. "Ensaiamos uma volta, mas a mulher e os filhos (quatro) não se readaptaram ao Brasil".
O Paraguai vai aumentar em 15% sua produção de soja nesta safra. De 1,793 milhão de toneladas produzidas na safra 92/93, a perspectiva é de uma colheita de 2,1 milhões de toneladas. A área plantada cresceu de 65 mil hectares para 850 mil hectares. A soja é hoje o principal produto de pauta das exportações, seguida pelo algodão.
Comparada ao Brasil, a terra é barata no Paraguai. Na parte oriental do país (Alto Paraná, Canindeyú, Itapúa e Caagazú), é possível encontrar latossolo roxo a preço médio de US$ 1.500 o hectare. O mesmo tipo de solo custa no noroeste do Paraná entre US$ 7.000 e US$ 12 mil.
Acostumados a trabalhar com cooperativas em seus Estados de origem, no Paraguai os brasileiros encontraram as empresas exportadoras para o fornecimento de insumos e financiamento da produção. Os bancos paraguaios não financiam diretamente os produtores. São as exportadoras que cumprem, junto ao produtor, as funções de agentes financeiros e de cooperativas.
Luis Roberto Frígola, 49, presidente da Câmara de Exportadores de Soja e Oleaginosas do Paraguai, diz que os bancos preferem financiar as empresas, "que agem como as cooperativas no Brasil". Frígola dirige a Amcorp (American Corporation S/A), responsável pela exportação de 10% da produção de soja paraguaia.
Com um patrimônio equivalente ao de grandes cooperativas do Paraná, a Amcorp possui frota própria de caminhões para o transporte da soja a ser exportada (via Paranaguá) e também um comboio de 12 barcaças, com capacidade de transporte de 20 mil toneladas pelos rios Paraguai e Paraná.
Nos dois últimos anos, a Amcorp ganhou um novo concorrente, a Marangatu Oleos (grupo Bamerindus). Instalada em Minga-guazu (Alto Paraná), a Marangatu faz o esmagamento da soja paraguaia, mostrando uma nova tendência do país, que é a de investir na agroindústria.
O governo paraguaio iniciou em 91 um processo de modernização econômica visando se tornar um país agroindustrial. "Vamos seguir nossa vocação natural", diz o ministro de Indústria e Comércio, Ubaldo Scavone Yodice. Segundo ele, os recursos hídricos e a abundância de energia elétrica no país fazem com que as perspectivas de instalação de agroindústrias sejam animadoras.
Para atrair os investidores, o governo acelerou o processo de privatização das empresas estatais e fez alterações profundas na política econômica, com câmbio livre e nova legislação tributária.
O entusiasmo, porém, não é compartilhado por todos. Alejandro Gonzalez Acosta, presidente da Manufactura de Pilar S/A, maior fábrica paraguaia, reclama da falta de uma justiça confiável e do poder dos generais. "Basta um telefonema de um general e muda tudo de uma hora para outra".
Acosta é vice-presidente do grupo Palma, controlador de várias empresas e maior exportador de fumo do Paraguai. O presidente do grupo, Guilhermo Caballero Vargas, foi candidato derrotado à presidência da República pelo partido Alternativa Nacional nas últimas eleições presidenciais.

Os jornalistas JOSÉ MASCHIO e NIELS ANDREAS viajaram ao Paraguai a convite do Bancopar.

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