São Paulo, sexta-feira, 14 de janeiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Aposentadoria especial para os cassados?

SANDRA STARLING

O capítulo da Previdência Social da Constituição está entre os mais visados no processo de revisão constitucional. Aliás, antes mesmo do início da revisão, o ex-ministro Antônio Britto já proclamava aos quatro ventos a necessidade de pôr um fim à aposentadoria por tempo de serviço, sugerindo a adoção da fórmula mita que combinaria tempo de serviço e idade. Segundo ele, o país já não comporta mais sustentar o contingente daqueles que adquiriram o direito de se aposentador após 30 ou 35 anos na ativa, sem constar as aposentadorias especiais de professores, jornalistas, mineiros etc.
O debate sobre a questão está na ordem do dia. O mesmo não ocorre, porém, em relação a um dos mais odiosos privilégios da chamada "classe política" brasileira. Refiro-me à aposentadoria dos parlamentares, bancada pelo IPC ou Instituto de Aposentadoria dos Congressistas. A ele pertencem, obrigatoriamente, todos os deputados federais e senadores e, facultativamente, qualquer funcionário de carreira da Câmara ou do Senado. Na lista dos que hoje recebem pensão (proporcional ou integral) figuram nomes como o de Itamar Franco, Leonel Brizola, Geraldo Bulhões e do ex-ministro Henrique Hargreaves.
Aqui não se discute se os detentores de mandato devem ter aposentadoria. Questiona-se o tempo mínimo e quem deve arcar com o ônus do benefício. Seria desejável que a contribuição se desse para o INPS com as mesmas regras do trabalhador comum, podendo os parlamentares, se quisessem, criar sua previdência particular, sem onerar os cofres públicos.
No caso do IPC, qual o tempo mínimo de contribuição que permite o recebimento proporcional do benefício? – apenas oito anos. E esses minguados oito anos não precisam ser contados só no exercício do mandato federal: é possível contar também um mandato estadual ou municipal.
Muitos interessados dirão que não se trata de maracutaia já que os parlamentares contribuem mensalmente para o Instituto. O que eles não revelam, mas que é de arrepiar para quem vive os problemas dos famintos brasileiros, é que o Tesouro Nacional também banca a brincadeira. Só na proposta orçamentária para 1994 –como esta Folha revelou– estão previstos nada mais nada menos que US$ 17 milhões para o IPC. Quantia esta que chegará a US$ 50 milhões de dólares, segundo previsão do próprio diretor geral da Câmara dos Deputados.
Em outras palavras, o contribuinte –o miserável trabalhador de salário mínimo– também ajuda a pagar a mordomia dos parlamentares que podem se aposentar proporcionalmente com oito anos de serviço!
Se esses dados não forem suficientes para mostrar a odiosa face desse privilégio, resta perguntar: o povo brasileiro acha justo que a máfia do Orçamento, depois de punida, venha a usufruir dessa aposentadoria? Pois pelo que prevê o estatuto do IPC, João Alves, por exemplo, mesmo cassado, receberá por mês a bagatela de CR$ 1,2 milhões, graças a seus mais de 30 anos como deputado!.. Quem tem o mandato cassado merece aposentadoria subsidiada pelos cofres públicos?

Texto Anterior: Mato Grosso do Sul 1; 2; 3; Goiás
Próximo Texto: Brasil é o décimo país em morte infantil
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.