São Paulo, segunda-feira, 17 de janeiro de 1994
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Dr. Know, guitarrista da primeira banda negra de hardcore do mundo, é fã de Flora Purim e Tom Jobim

ALCEU TOLEDO JUNIOR
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Apesar de extremamente importante no cenário musical atual –influenciou grupos como Fishbone e Red Hot Chili Peppers– a banda norte-americana Bad Brains começa a ficar conhecida no Brasil só agora, 15 anos depois de sua formação. Esse é o primeiro grupo negro de hardcore e o pioneiro na mistura de hardcore com funk, metal e reggae.
"Rise" é o único disco da banda lançado no Brasil, pela Sony, já com o novo vocalista Israel Joseph-I. O guitarrista Dr. Know falou ao Folhateen pelo telefone de sua casa em Woodstock, Nova York.
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Folha - Por que o vocalista HR saiu da banda?
Dr. Know - Ele cantava reggae e o Bad Brains quer tocar de tudo um pouco.
Folha - Foi difícil encontrar um substituto?
Dr. Know - Sim. Primeiro testamos Chuck Mosely, que era do Faith No More. Ele é um cara legal, mas não se adaptou. Fizemos uma audição, mas ninguém foi aprovado. Uma garota nos disse que conhecia alguém capaz de cantar nossas músicas. Ela nos apresentou Israel e gostamos dele.
Folha - "Rise" tem músicas bem diferentes, como a balada 'Without You'. Alguns fãs antigos acharam estranho.
Dr. Know - Bem, nascemos em Washington, que é uma cidade de grande população negra. Crescemos ouvindo rhythm'n'blues. E isso está em nosso sangue. Não tocamos o que as pessoas gostariam.
Folha - Na faixa 'Unidentified' vocês tocam a introdução da música "I Against I", do álbum que tem esse nome. Isso é tradição da banda?
Dr. Know - É isso mesmo. E em nosso próximo álbum regravaremos a faixa "Outro", que fecha o "Rise", só que numa versão de maior duração.
Folha - Como se sente ao ver tantos fãs de gostos musicais diferentes em seus shows?
Dr. Know - Isso é emocionante. Hoje você vê rap misturado com reggae, rock com reggae etc. Muita coisa mudou depois que o Run DMC fez aquela gravação de "Walk This Way" com o Aerosmith, mostrando que rap e metal combinam.
Folha - Mas o Bad Brains fazia essa mistura bem antes.
Dr. Know - Há quem diga que somos pioneiros na fusão de estilos, mas não considero isso tão importante. Tentamos tocar para todos, sempre oferecendo mensagens positivas.
Folha - Alguns críticos consideram as letras agressivas.
Dr. Know - Não concordo. Tentamos dizer a verdade sobre o que sentimos. Na verdade, dizemos que as pessoas têm que acordar e não acreditar em qualquer coisa que ouvem.
Folha - Por que vocês foram para Nova York?
Dr. Know - Porque os clubes de Washington não nos queriam mais. Diziam que nossa música era violenta. Em todos os shows acontecia o pogo (forma agressiva de dança usada por punks), e a polícia acha que isso estimula a violência, o que não é verdade. Então decidimos viver em Nova York, desde 1980.
Folha - Quais são seus guitarristas preferidos?
Dr. Know - Gosto de Vernon Reid, do Living Colour, Al Dimeola, John McLaughlin e Frank Zappa. Mas meu ídolo é o jazzista Wes Montgomery.
Folha - Parece estranho você gostar de Frank Zappa.
Dr. Know - Gosto dele. Vi ele tocar uma vez. Agora ele está num lugar melhor. Ele foi uma grande inspiração para mim. Era um grande músico.
Folha - A religião rastafari influencia a banda?
Dr. Know - Eu diria que nossa crença é importante para você se conhecer melhor, respeitar as pessoas. Infelizmente, ainda há muito preconceito racial, mas os tempos de Reagan e Bush se foram. Agora há uma nova geração de políticos que aprenderam com nossos próprios erros e estão preocupados em construir um mundo melhor.
Folha - Quais são os planos da banda para 94?
Dr. Know - Em fevereiro vamos ao Japão e depois para a Europa.
Folha - Os fãs brasileiros podem sonhar com um show aqui?
Dr. Know - Gostaria muito de ir ao Brasil, mas não há nada previsto. Gosto muito de música brasileira, especialmente Tom Jobim. Também gosto de Flora Purim. Já vi cinco shows dela.

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