São Paulo, quinta-feira, 6 de outubro de 1994
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Voto mudo

Os altíssimos índices de votos em branco e nulos nestas eleições merecem uma reflexão mais detida. Com efeito, de acordo com os primeiros resultados oficiais, os sufrágios em branco e nulos para a Presidência, o cargo mais importante do país, somam mais de 16%. No primeiro turno da eleição de 89, esse número foi de apenas 5,67%.
No caso das eleições para os governos estaduais, o total de votos em branco e nulos supera em quatro Estados os dados ao primeiro colocado. Em outros oito os brancos e nulos ficam em segundo lugar. Imagine-se o que virá das votações para os cargos proporcionais.
Cumpre tentar analisar as razões desse fenômeno. A primeira e mais evidente delas parece ser a própria complexidade dessas eleições para uma população cujo grau de instrução é para a maioria muito baixo.
Um exemplo: os brancos e nulos para a Presidência entre os brasileiros que moram fora do país, pessoas em geral mais instruídas, não passam de 3%; já em Alagoas, esse montante chega a 29%.
É inegável que a política passou por um forte desgaste nos últimos anos. Houve o impeachment de um presidente e vários escândalos envolvendo parlamentares. É natural, embora lamentável, que as pessoas considerem os políticos todos iguais ou que ``nenhum presta".
De toda a forma, é possível superar esse quadro. Em primeiro lugar é urgente simplificar a eleição. Existem soluções criativas e eficientes. Na África do Sul, por exemplo, a cédula vem com o logotipo do partido e a foto do candidato. Na Índia, recorre-se a figuras de animais.
Mais importante, porém, seria realizar reformas políticas. É preciso, por exemplo, eliminar o anacronismo que representa a instituição do voto obrigatório. Se só forem às urnas aqueles que o desejam, como ocorre em países civilizados, é de se supor que os votos sejam mais conscientes, ponderados.
Também seria útil adotar o chamado voto distrital misto. Esse tipo de regime eleitoral tende a aproximar os deputados de seus representados. É uma reforma que despertaria maior interesse pelos pleitos legislativos e aprimoraria a qualidade dos políticos, que seriam cobrados com maior severidade.
É do próprio interesse da classe política em geral que essas mudanças venham a ser encampadas. Afinal, políticos querem ser vistos e ouvidos. Nada mais incômodo que ter representatividade menor que a do silêncio e do deprezo.

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