São Paulo, quinta-feira, 20 de outubro de 1994
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Rainha dos baixinhos tem seus dias contados

DAVID DREW ZINGG
DE MIAMI

Para o Velho Espião Mestre Dave, Miami possui toda a aura de mistério de Viena durante a Guerra Fria.
Viena era a porta de entrada para a Europa oriental, de ingresso proibido; Miami é a entrada para o turbulento Caribe do Haiti, de Cuba e de todas as minúsculas e sofredoras republiquetas de bananas da América Central.
Miami tem múltiplos sabores, devido às diversas colônias de refugiados de diferentes países da América Latina. Viena foi ocupada pelos britânicos, franceses, soviéticos e gringos.
Esta cidade úmida, quente, confusa e complexa sempre me faz sentir em mais uma metrópole tropical.
O abraço de Miami é quente e úmido. É uma cidade moderna com hábitos decadentes. Usuários ``hi-tech" da Internet frequentam o mesmo bar que sodomitas. Exilados empresários direitistas cubanos esboçam políticas do Departamento de Estado dos EUA em torno de ``cafezitos" em suas coberturas em Coral Gables.
Há muitas coisas a aprender em Miami, tanto elevadas quanto baixas.

Dr. Escória
A atmosfera morna de Miami parece ser propícia à indecência. A indecência, em Miami, propicia o jornalismo investigativo de alta qualidade. Uma das mais promissoras repórteres investigativas de Miami é a jornalista jovem e enganosamente atraente Elise Ackerman. A srta. Ackerman escreve para o grande jornal tablóide de Miami, ``The New Times".
Espero que você já tenha tomado seu café da manhã, Joãozinho, porque a mais recente matéria da srta. Ackerman não é exatamente o tipo de leitura que acalma um estômago vazio.
A manchete dizia ``Remédio Amargo", e o subtítulo prosseguia: ``Ele teria acariciado pacientes contra sua vontade. Pacientes de Aids. Não surpreende que seja conhecido como Dr. Escória".
No artigo que se segue, cuidadosamente documentado e profundamente inquietador, Ackerman relata as chocantes indecências cometidas por um médico de 53 anos, formado pela University of Miami School of Medicine.
O bom médico especializou-se em ajudar pacientes portadores do HIV que não tinham seguro-saúde. Em respeito a teus sentimentos matinais delicados, tio Dave vai te poupar dos detalhes das descobertas documentadas da repórter Ackerman. Direi apenas que as atividades sexuais ilícitas do ``Dr. Escória" preencheriam o rol inteiro de atrações de um filme pornô cinco estrelas.

Baby Blue
``Baby Blue" (algo como fofinha) é como o ``Miami Herald", outro grande jornal local, se refere à nossa Xuxa.
Uma das melhores repórteres do ``Herald" é uma moça chamada Katherine Ellison, que é correspondente viajante na América Latina. A srta. Ellison costuma cobrir eleições, terremotos e outros desastres naturais.
Tio Dave tem uma teoria particular, só dele: que as leis da seleção natural vão determinar que a superioridade natural das mulheres as leve a controlar o mundo. Também creio e antecipo com prazer o dia em que os homens serão relegados à cozinha e ao quarto, onde podem se desincumbir dos deveres para os quais possuem competência básica. Isto é uma maneira de dizer que também acredito que, por sua capacidade, inteligência e charme, as mulheres estão a caminho de dominar o setor das comunicações.
Seja como for, voltemos a Katherine Ellison, que eu não conheço, embora esteja ansioso por isso.
Em um número recente da revista de domingo do ``Miami Herald", chamada ``Tropic", a srta. Ellison apresentou uma matéria de capa sobre Xuxa ``Baby Blue" Maria das Graças Meneghel. Em seu artigo, Ellison, olhando Xuxa do ponto de vista da Gringolândia, formula a pergunta crucial: ``Será que os EUA estão prontos para receber a sexy imperatriz da televisão infantil latina?"
A resposta não é muito positiva.
O artigo é bastante abrangente e inclui fotos que começam com Xuxa de biquíni, em 1982, durante sua época de modelo erótica, passa por uma foto em preto-e-branco de uma Xuxa bem-comportada, aos 17 anos, sentada no colo de seu namorado quarentão Pelé, e chega até Xuxa sorrindo para o papa João Paulo 2º na praça São Pedro, em Roma.
Diz o artigo que Xuxa é muito rica. No ano passado, a revista Forbes a incluiu em sua lista dos 40 maiores ``entertainers" –a primeira latino-americana a figurar na lista. A revista informou que sua fortuna já havia ultrapassado a de Madonna e se equiparado à de Arnold Schwarzenegger.
``Sua fama estava crescendo, suas perspectivas promissoras pareciam ser enormes e seus horizontes se estendiam a perder de vista", prossegue o artigo.
``A investida de Xuxa na América do Norte de língua inglesa foi seu primeiro grande erro", diz Ellison.
A seguir, o artigo descreve o ``fracasso" de Xuxa, em 1993, na TV a cabo da Gringolândia. Sua audiência caiu para 1% de seu público-alvo infantil. Alguns canais passaram seu programa para horários ingratos. Outros simplesmente deixaram de transmiti-lo. Um analista de mercado de TV teria dito, segundo o artigo, que ``Xuxa é produto danificado nos EUA".
O mundo se divide em seus sentimentos sobre a imagem pública de Xuxa. Metade de seus telespectadores simplesmente a adora, e metade acha sua pose de ``Baby Blue" de 31 anos simplesmente detestável.
Katherine Ellison tem más notícias para o primeiro grupo.
Marlene Mattos, a eficiente empresária que dirige Xuxa, tem um limite de tempo. Quando Ellison perguntou a Mattos quanto tempo Xuxa ainda tem pela frente, ela respondeu ``sem hesitar":
``Quatro anos".
Ellison diz: ``Depois disso, Mattos quer voltar à faculdade de Direito e tornar-se juíza."
``Além disso", diz Mattos, ``Xuxa terá 35 anos, quando deverá começar a pensar em cuidar de seus próprios filhos, em vez de se ocupar dos filhos de todo mundo."
Segundo o artigo, Mattos já avisou Xuxa mais de uma vez sobre seu tempo-limite.
``Eu digo a ela que tudo tem um início, um meio e um fim e acho que você precisa se preparar para o fim", teria dito Mattos. ``Você não deve deixar que o fim chegue a você."
Certa vez, o Velho Fotógrafo Dave tirou uma foto para a capa da ``Vogue" brasileira que mostrava Pelé delicadamente oferecendo um minibuquê de violetas a Xuxa. Ela era um docinho de coco.
Agora, meia vida depois, ``Baby Blue" é várias vezes milionária.
Ela também está bem mais triste e bem mais sábia.
Em lugar de treinar seu inglês, ela poderia começar a pensar sobre o que vai fazer daqui a quatro anos.

Tradução de Clara Allain

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