São Paulo, sábado, 22 de outubro de 1994
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Modificações ordinárias

GERALDO ATALIBA

Queixam-se, com razão, os empresários da complicação e excessos burocráticos do sistema tributário. A ele imputa-se desestímulo ao investimento produtivo, desincentivo à criação de empregos e dificultação das exportações.
A pregação de FHC deu ênfase, por isso, à reforma tributária. Seu principal opositor, Lula, adotou igual postura. Disso se vê que gregos e troianos estão insatisfeitos com o sistema tributário. No plano abstrato, há unanimidade. No momento de oferecer soluções, começam as dissenções, dada a variedade de perspectivas e os conflitos de interesses.
É generalizada, embora vaga e sem objetividade, a idéia de que só mudando a Constituição se pode dar solução ao problema. Isso torna dramática a angústia dos que desejam a continuidade e a complementação do Plano Real.
Na verdade, está ao alcance do governo federal providenciar –mediante simples modificações legislativas– a solução para 90% dos problemas.
Mediante lei elimina-se tributos inconstitucionais, superposições de impostos; simplifica-se a burocracia, reduzem-se alíquotas, corrigem-se exageros e moderam-se os desvios (que se vieram acumulando ao longo dos últimos anos de desvario político e fiscal).
Mediante lei ordinária federal, removem-se os desincentivos ao investimento produtivo, os obstáculos à exportação, os desestímulos à produção e à criação de empregos.
Por lei ordinária se pode –como o postula a Constituição, a nosso ver, claramente– reduzir a contribuição social do empregador a uma só, combinando (para fixar sua base de cálculo) as grandezas do faturamento, da folha de salários e do lucro, revogando-se o amontoado inorgânico, irracional, ilógico, aflitivo e inconstitucional de contribuições que esmagam as empresas e atormentam seus gestores.
Quanto ao ICMS, não se alegue que –sendo imposto estadual– exige emenda constitucional para obviar seus problemas. Grande parte das questões relativas a esse imposto resulta de leis e regulamentos inconstitucionais, aprovados por uma jurisprudência imediatista e açodada, cujas raízes estão no fiscalismo desvairado do regime autoritário.
Isso se pode mudar: a União recebeu clara competência para cuidar do interesse nacional, que está sendo solapado pelos Estados (com abono impensado do Judiciário).
Ainda é tempo de –em nome desse interesse– a Advocacia Geral da União intervir nos processos em que leis e regulamentos estaduais violam a letra e o espírito da Constituição, principalmente em matéria de exportações. Ademais, o presidente da República é titular do direito de propor ação direta de inconstitucionalidade das leis e atos normativos estaduais (art. 103).
Além disso, a Constituição previu leis complementares, em matéria de ICMS, que lhe permitem colocar a visão global nacional acima dos mesquinhos e imediatistas interesses locais. A modificação de leis complementares nessa matéria pode aliviar significativamente a aflição das empresas.
Por último, com o ``uso intensivo do instrumental de seletividade" –como o propôs, nesta Folha, o secretário da Fazenda do Paraná, Heron Arzua– pode-se reduzir substancialmente o custo da cesta básica e os encargos das microempresas.
Basta considerar despreconcebidamente a Constituição para ver-se tudo isso, e muito mais, com clareza.

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