São Paulo, sexta-feira, 28 de outubro de 1994
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A abertura e o fim dos fantasmas

LUÍS NASSIF

Fato curioso ocorreu recentemente no país. A General Motors anunciou a suspensão de seu programa de investimentos, em aparente protesto contra a redução de alíquotas dos importados.
Em outros momentos da vida nacional, os alicerces da República seriam abalados.
Desta vez não ocorreu nada disso. Foi uma reação tão insossa, tão sem emoção, que ficou parecendo que o Brasil já não é mais o mesmo. Até os velhos fantasmas estão decrépitos e desdentados, como a assombração de Canterville.
O que ocorreu foi a abertura da economia, estabelecendo novamente a competição no mercado automobilístico. Acabou o oligopólio da oferta e do investimento. Investir ou não transformou-se em questão de sobrevivência para as próprias empresas, não para o país. Porque quem parar, será miseravelmente atropelado pelo concorrente.
Abertura, mais perspectiva de estabilização com crescimento, tornaram o Brasil país chave na grande disputa do capital internacional. Se a montadora em questão persistir em sua ameaça, suas competidoras internas ampliarão ainda mais seus investimentos. Mais: as montadoras japonesas e coreanas definem como limite para investimento interno a venda de 20 mil unidades/ano para determinado mercado. Passou disso, instalam fábricas no país-mercado.
Obviamente como empresa moderna e dinâmica, que já anunciou publicamente sua decisão de tornar-se a primeira do ranking, a GM não pretende parar investimentos coisa nenhuma.
Utilizou o anúncio da implantação de uma fábrica fora de São Paulo como forma de pressionar os sindicatos locais a serem mais cooperativos. Conquistado o acordo, decide-se pela ampliação de sua fábrica em São José dos Campos, por razões exclusivas de logística. Mas aproveita para caracterizar a desistência da nova fábrica como um ato político contra a abertura. Que ninguém engoliu.
Podres poderes
Na revisão constitucional, o presidente da Confederação Nacional das Associações Comerciais, Guilherme Afif Domingos, tornou-se o comandante do patrulhamento contra os parlamentares que não participaram dos trabalhos.
Ontem, o mesmo Afif aliou-se a figuras notórias do esquema Itamar (como José de Castro e Humberto Motta) para tomar o poder no Sebrae, permitindo a indicação política de Mauro Durante para a presidência executiva de um órgão que vinha se destacando nacionalmente pela excelência técnica.
A representação empresarial, da mesma maneira que as representações de classe, também é braço do mesmo modelo verticalizado e embolorado, que se apossa de todas as iniciativas saudáveis da sociedade, e as apodrece sob o peso de interesses menores.
É bom que as associações comerciais comecem a analisar seriamente a qualidade de sua representação nacional. Porque está claro que tornaram-se massa de manobra de políticos mais que convencionais.

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