São Paulo, sexta-feira, 28 de outubro de 1994
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O soccer nos EUA

SÍLVIO LANCELLOTTI

No último fim-de-semana, na abertura da reunião que a Fifa realiza em Nova York para avaliar a Copa/94 e para rascunhar a de 98, Alan Rothenberg, o presidente do Comitê Organizador do torneio dos EUA, informou euforicamente que o certame deu um lucro acima de US$ 60 milhões.
Dias depois, o mesmo Rothenberg, sem nenhuma vibração, anunciou que dificilmente seu país conseguirá montar uma liga profissional de futebol, conforme prometera à Fifa ao ser aquinhoado com a Copa de 94. Ridículo, mas absolutamente previsível.
A Copa dos EUA foi a pior possível –ao menos a pior que eu testemunhei desde a minha estréia como repórter da revista ``Veja" no torneio do México/70. Falta ao público americano a mais insignificante centelha de prazer pelo futebol.
Foi fácil constatar, durante a Copa/94, essa ausência de interesse. Encheram os estádios, o torneio quebrou todos os recordes de presença nas arquibancadas? Sim. Isso aconteceu, todavia, graças a duas condições. Primeiro, os EUA são uma nação de imigrantes e as suas múltiplas etnias não deixaram de apoiar as suas pátrias de origem. Segundo, em comparação às competições do México/86 e da Itália/90, me pareceram muito razoáveis os preços das excursões.
Paralelamente, os integrantes do Comitê Organizador, com raríssimas exceções, fizeram de tudo para ignorar ou para atrapalhar as necessidades dos visitantes.
Quase todos eles, cerca de 300 profissionais e de 5.000 voluntários, grudaram em suas mentes um único recado: ``Aqui não se pode fumar". Nos nove núcleos de imprensa da Copa, ninguém sabia informar onde ficavam os banheiros ou de que forma o jornalista podia consertar o plug do seu fone celular. Em grupo, no entanto, fervorosamente patrulhavam os fabricantes de fumaça.
Apenas em Washington e em Nova York houve algum espaço. Nos outros campos, o jornalista se sentava ao sol ou à chuva, e que se danassem os seus equipamentos de trabalho. Nem sequer havia água para matar a sede. Os raros sanitários existentes eram cabaninhas, como essas de obra.
Enquanto isso, o melífluo Rothenberg se esmerava em se propor a uma coletiva por dia. Depois da inaugural, em que ele não disse nada de aproveitável, ninguém mais apareceu. Grotesco. A Copa deu lucro, sim, por causa do apoio da Fifa. O soccer nos EUA, porém, morreu antes de nascer.

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