São Paulo, terça-feira, 8 de novembro de 1994
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"Orgasmo vaginal não existe"

DO "WORLD MEDIA"

"O orgasmo vaginal não existe"
Shere Hite é uma das sexólogas mais controvertidas dos Estados Unidos. Seu "Relatório Hite sobre a Sexualidade" vendeu mais de 20 milhões de exemplares em 36 países. Mas numerosos críticos e especialistas o ridicularizaram. Há três anos, Shere Hite fugiu de seus críticos e deixou Nova York para se instalar na Europa.
Com a veemência que a caracteriza, Hite afirma que o orgasmo vaginal não existe e que a família com um só progenitor tem vantagens sobre o modelo tradicional de pai e mãe, já que os meninos criados por mães sozinhas se dão melhor posteriormente com as mulheres.
Pergunta - O "Relatório Hite" mostrou que as mulheres podiam e deviam ter prazer. Por que esta constatação tão simples chocou tanto?
Resposta - Neste primeiro livro, publicado em 1976, me debrucei sobretudo sobre o orgasmo vaginal e o clitóris. Meus precursores, Masters e Johnson, sustentaram que a mulher deveria gozar durante o coito, mas não explicaram como. Acreditava-se que era uma disfunção se as mulheres não gozavam apenas com o movimento do pênis.
Pedi a milhares de mulheres que me descrevessem o que as excitava e as fazia gozar. Dois terços delas me responderam que o orgasmo vinha com a estimulação clitoridiana ou exterior, frequentemente durante a masturbação. Concluí que a definição dada ao sexo pela sociedade era muito estreita. Muitas mulheres se consideravam pecadoras se não gozavam durante a relação sexual. Mas eu lhes demonstrei que era perfeitamente normal se servir da mão ou da boca para gozar.
Pergunta - Como essas idéias foram recebidas?
Resposta - Não muito bem. Meus livros eram proibidos na ex-URSS e ainda não são encontrados no mundo árabe. Mesmo em meu país a situação ficou tão difícl que tive que deixar os EUA.
Pergunta - As coisas melhoraram hoje nos EUA?
Resposta - É difícil dizer. Por exemplo, como se devem interpretar os ataques de que é alvo Hillary Clinton? Pelo menos seu marido a apóia e não faz como Mandela. Mais seriamente, eu diria que nada mudou e que os homens continuam a considerar um pedido de estimulação clitoridiana como um insulto a seu pênis.
Pergunta - Você não vê nenhum progresso?
Resposta - Vejo. Muitas mulheres compreendem hoje que não é uma vergonha ter necessidade de estimulação clitoridiana para gozar. Mas os homens devem ampliar a idéia que têm do sexo.
Pergunta - Então o verdadeiro problema são os homens?
Resposta - São. Infelizmente certos homens têm uma reação instintiva contra todo tipo de mudança social.
Pergunta - O que é preciso fazer?
Resposta - Precisamos expressar nossos sentimentos íntimos. As mulheres dizem que não querem estar nesta corrida pelo orgasmo. Mas têm o sentimento de que os homens querem gozar todas as vezes e se perguntam: "Por que não posso também? Com que direito ele dorme e me deixa sozinha com meus pensamentos?" As mulheres querem que os homens esqueçam um pouco o orgasmo e se tornem mais sentimentais. Querem que o sexo seja também uma emoção.
Pergunta - O feminismo então não mudou nada para as mulheres no que diz respeito ao sexo?
Resposta - Muitas vezes, a mídia faz parecer que as feministas exigem uma melhor potência sexual dos homens. Isso é falso. O feminismo procura antes de tudo deixar os homens melhor em seus corpos. Não é um meio de obrigar os homens a prolongarem por mais tempo a ereção. Muitos homens não fazem amor mais de medo de brochar. Chegar nesse ponto não resolve nada para ninguém, nem para os homens nem para as mulheres.

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