São Paulo, sexta-feira, 18 de novembro de 1994
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Uma ponte entre o Pacífico e a América do Sul

HERALDO MUÑOZ

Esta semana o presidente do Chile, Eduardo Frei, viajou à Bogor, Indonésia, para participar da Cúpula Presidencial do Foro de Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico (Apec) no dia 15 de novembro, marcando assim a incorporação formal do Chile, como membro número 18, à este importante foro da região Ásia-Pacífico, que reúne Japão, China, Coréia do Sul, Taiwan, Cingapura, Hong Kong, Malásia, Tailândia, Indonésia, Brunei, Austrália, Nova Zelândia, Filipinas e Papua-Nova Guiné, além dos países da América do Norte.
O Chile é o primeiro país da América do Sul a integrar-se a esse organismo que agrupa países cuja produção equivale à metade do PIB mundial e que geram 45% do comércio mundial. Depois do ingresso do Chile, foi decretada uma moratória para a entrada de novos membros até novembro de 1996.
Mas não é somente o Chile que se integra à Apec, senão que, potencialmente, é um primeiro passo para relações mais estreitas entre a América do Sul e a região Ásia-Pacífico. O propósito do governo do presidente Frei é o de converter o Chile em uma ponte útil entre a América Latina e a Ásia Oriental, as zonas econômicas mais dinâmicas do mundo nestes momentos.
A Apec acordou estabelecer para o ano 2020 uma zona de livre comércio através de um desgravamento tributário gradual (os países desenvolvidos alcançariam o objetivo antes, em 2010). Um tema a definir é se tal processo de abertura comercial operaria somente na Apec, ou se deveria se estendido a terceiras nações sem a exigência de reciprocidade. O Chile favorece esta última postura de "regionalismo aberto".
A presença do Chile no Pacífico não é um assunto recém-iniciado. Desde 1990 o setor privado chileno é membro do Conselho Econômico da Bacia do Pacífico (PBEC), organismo de caráter empresarial; o Chile também participa desde março de 1991 no Conselho de Cooperação Econômica do Pacífico (Pecc), organismo que agrupa acadêmicos, empresários e personalidades do governo em representação pessoal.
Mais importante ainda é que em uma análise das exportações que os países selecionados da América do Sul enviam à região Ásia-Pacífico no total de suas exportações, pode-se constatar que o Chile é, de longe, o mais orientado à Bacia do Pacífico, com mais de 31% de suas exportações (US$ 2.866 milhões) que vão até tal área, seguido do Brasil com 15% e da Argentina com 10%.
O Japão e a Coréia do Sul são os principais parceiros comerciais do Chile na região Ásia-Pacífico, mas o Chile tem desenvolvido estreitas relações com outros países daquela zona.
Por exemplo, o Chile e a Malásia têm um comércio bilateral de mais de US$ 150 milhões, e "joint-ventures" entre empresários do Chile e da Malásia produzem sapatos de segurança industrial em Kuala Lumpur que são exportados aos Estados Unidos e Europa, e barcos no Chile para a Malásia.
A presença da Malásia no Chile pode-se constatar no fato de que o holding de empresas Malaysia South-South Corporation construiu um moderno prédio em Santiago para apoiar suas iniciativas comerciais e de investimento no país.
A Nova Zelândia é outro outro caso ilustrativo. Os investimentos neozelandeses no Chile somam quase US$ 1 bilhão, convertendo o Chile no terceiro destino mais importante do investimento neozelandês no mundo.
A embaixada da Nova Zelândia em Santiago é a única na América do Sul, o que também reflete a importância dos vínculos bilaterais entre os dois países. Em suma, a localização do Chile frente ao Pacífico não é simplesmente um dado geográfico, mas também uma realidade econômico-comercial.
A importante orientação diplomática, geográfica e comercial do Chile para os mercados da Ásia-Pacífico pode, portanto, ser de grande utilidade para a projeção dos países do Mercosul em direção a tais mercados (o Chile colaborou recentemente com o estabelecimento de missões diplomáticas entre o Uruguai e a Malásia).
A aproximação com a Apec pode significar acesso à informação, cooperação tecnológica, investimentos e livre comércio. Esse desafio delineia, por sua vez, a necessidade de uma interconexão expedita e rentável Atlântico-Pacífico.
Para o governo do Chile este é um tema da mais alta importância, pois é parte do esforço integracionista e tem uma especial importância para a zona norte do Chile. O Chile conta com o sistema portuário do Norte Grande de elevados níveis de eficiência e custos competitivos.
Há poucos meses, depois da primeira visita oficial de um embaixador do Chile ao Estado de Mato Grosso e da realização em Cuiabá de um seminário denominado "Ciclo do Pacífico: novos mercados e a integração latino-americana", o governador daquele Estado fez uma visita ao Chile que começou pelos portos de Arica e Iquique e terminou na capital, Santiago.
Como consequência dessa visita, nos primeiros meses de 1995 uma caravana de caminhões viajará desde Cuiabá, Mato Grosso, até o porto chileno de Arica para descarregar mercadorias, especialmente soja, para os mercados asiáticos.
Cabe mencionar que a abertura até o Pacífico não é fácil. Resta ainda um longo caminho por percorrer para a plena inserção do Chile, e da América Latina em geral, na região Ásia-Pacífico. Por exemplo, é necessário avançar até a eliminação de barreiras em termos de cotas e restrições para a exportação de produtos hortifrutícolas.
É necessário, além disso, superar a falta de conhecimento mútuo da realidade política, cultural e social entre a América Latina e a zona Ásia-Pacífico. A respeito deste último ponto, foi criado no Chile, recentemente, a Fundação Chilena para o Pacífico, e o Chile também assinou um acordo com o Centro Leste-Oeste da Universidade do Havaí em Honolulu, para treinar diplomatas chilenos em línguas e assuntos asiáticos antes de serem enviados às 23 embaixadas e cinco escritórios comerciais que o Chile tem nos países da região Ásia-Pacífico.
Em todo caso, o Chile está disponível para esse desafio, aportando, inclusive, estruturas e experiências para uma projeção do esforço integracionista latino-americano até as dinâmicas economias da região Ásia-Pacífico. O Chile pode ser uma grande porta de saída e entrada para os mercados da Apec, para benefício de todas as partes envolvidas.

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