São Paulo, sábado, 3 de dezembro de 1994
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Responsabilidade integral

ANTONIO OLIVEIRA SANTOS

A partir de 1º de janeiro do próximo ano, encerra-se mais um capítulo conturbado da vida política nacional e inicia-se um novo período na administração pública, cercado de fundadas esperanças no plano de governo do presidente eleito Fernando Henrique Cardoso.
Raras vezes, na história do Brasil, se conjugaram tantos fatores favoráveis à realização de um programa de desenvolvimento sustentado, capaz de redimir os erros do passado e dar prosseguimento às medidas de saneamento do setor público, de reforma do Estado e de consolidação de uma filosofia liberal capaz de devolver ao setor privado a iniciativa dos investimentos adequados à retomada das tradicionais taxas de crescimento.
Existe, em todos os segmentos da sociedade brasileira, um amplo consenso sobre a necessidade de redução da ingerência do setor público no domínio econômico e limitação da atuação do Estado às suas responsabilidades fundamentais, especialmente nas áreas da educação, saúde, justiça e segurança.
Em meio aos muitos equívocos da administração pública, nos últimos anos, é fora de dúvida que vários passos foram dados na direção certa, cabendo destacar o programa de privatização, a reformulação do setor de informática, a quebra das reservas de mercado e a abertura e maior integração aos mercados internacionais, cujos benefícios já são evidentes, no sentido da modernização do parque industrial brasileiro.
Paralelamente, o programa de estabilização monetária, iniciado com o Plano Real, é um marco que não se pode perder na luta contra a insidiosa inflação.
A sociedade brasileira espera do próximo governo a continuidade firme de todos esses programas. Mas, certamente, não terminam aí os compromissos da nova administração, nem tampouco as responsabilidades da sociedade em apoiá-los.
A arrecadação tributária e das contribuições sociais já atingiram níveis suficientes para permitir um equacionamento racional, capaz de ensejar a simplificação dos sistemas, o alargamento do universo tributável e a redução das alíquotas, com a melhoria consequente da eficiência da fiscalização, a redução dos custos administrativos, a recuperação da economia informal e a criação de novas empresas.
É imperiosa a tarefa de reforma do Estado e, inegavelmente, no quadro das primeiras prioridades, se incluem a reforma tributária e da Previdência Social. Sobre esses dois temas, de um modo consensual, exponho a seguir as sugestões dos empresários do comércio.
Reforma fiscal e tributária:
1) Dotar o sistema tributário de maior eficiência e justiça social, reduzindo alíquotas e alargando o universo dos contribuintes, com vistas a reduzir a sonegação. Preferência por impostos não declaratórios.
2) Reduzir o custo administrativo da arrecadação e da fiscalização, aliviando a burocracia nas empresas e aumentando a eficiência operacional.
3) Reestruturar as finanças públicas, transferindo encargos que hoje pesam sobre a União, mas que deveriam pertencer aos Estados e municípios.
4) Restituir eficácia à política fiscal anticíclica, hoje inviabilizada pelo princípio constitucional de transferência de 50% do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados para os Estados e municípios.
5) Reforçar o sistema federativo, mediante redistribuição dos impostos que torne os governos estaduais e municipais menos dependentes de Brasília.
Sistema de Seguridade Social:
1) O sistema de aposentadorias deve ter uma estrutura oficial obrigatória, para atender, principalmente, os trabalhadores de menor renda, com limites de cobertura para as aposentadorias e pensões, e uma estrutura privada, de adesão voluntária e caráter complementar, com alcance determinado pela capacidade contributiva dos interessados.
2) A aposentadoria por tempo de serviço deve ser substituída pela aposentadoria por idade, ou por um sistema misto fundado na viabilidade dos cálculos atuariais.
3) É inaceitável o privilégio das chamadas "aposentadorias especiais", inclusive algumas com apenas cinco anos de trabalho, que constituem clamorosa injustiça contra sociedade brasileira.
4) A assistência médica –coordenada pelo Ministério da Saúde– deveria ser desvinculada da Previdência, principalmente para permitir a unificação do sistema de saúde e a repartição dos ônus de sua cobertura pelos orçamentos dos governos federal, estadual e municipal, ao mesmo tempo em que buscasse privatizar a assistência médica que as empresas devem prestar aos seus funcionários.
5) A cobertura dos acidentes de trabalho, à semelhança de vários outros seguros, deveria ser da responsabilidade exclusiva da empresa e inserida no sistema privado de seguros.
6) Por outro lado, o seguro-desemprego, questão intimamente ligada aos ciclos recessivos, deveria ficar sob a administração do Ministério do Trabalho, desvinculado financeiramente da Previdência Social.
O primeiro grande teste da nova administração será aferido não só pelo controle da inflação, mas, igualmente, pela forma como encaminhará essas reformas fundamentais. É certo que não faltará ao novo governo a colaboração do setor empresarial, no contexto de suas próprias responsabilidades sociais, através de um diálogo construtivo e patriótico.

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