São Paulo, sábado, 3 de dezembro de 1994
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'A Voz Humana' volta no Crowne Plaza

MANUEL DA COSTA PINTO
DA REDAÇÃO

O espetáculo de teatro e canto lírico A Voz Humana, interpretado por Raquel Barcha e dirigido por Iacov Hillel, voltou a ser apresentado ontem, no Crowne Plaza, depois de representações na Sala São Luiz e na Aliança Francesa.
Fruto da parceria do escritor Jean Cocteau (1889-1963) e do compositor Francis Poulenc (1899-1963), a peça é um monólogo cantado, em que uma mulher conversa ao telefone com o amante que a abandonou.
A montagem de Hillel traz uma novidade em relação à concepção original: a parte instrumental, em vez de ser desempenhada por uma orquestra, é interpretada ao piano por Ulisses de Castro, a partir de transcrição da partitura de Poulenc.
Além disso, o texto é cantado em português, com base em versão de Cocteau feita por Lauro Machado Coelho.
O diretor Iacov Hillel já havia adaptado esta tradução de A Voz Humana em 1987, no Masp (Museu de Arte de São Paulo), com interpretação da soprano Céline Imbert e da Orquestra Sinfônica Jovem Municipal, regida pelo maestro Jamil Maluf.
Na nova montagem, diz a atriz e mezzo-soprano Raquel Barcha, o encontro entre voz e piano cria um clima mais intimista, explorando a expressividade propriamente cênica da peça.
A adaptação musical de A Voz Humana estreou em Paris em 1959. O texto, porém, era de 1930, época em que Cocteau e Poulenc estavam entre os principais nomes da vanguarda artística francesa.
Poeta, dramaturgo e pintor, Cocteau havia lançado, na década anterior, as idéias estéticas responsáveis pela formação do Grupo dos Seis –que reunia compositores como Arthur Honegger, Darius Milhaud e o próprio Poulenc.
Sob a influência do niilismo dadaísta e do universo onírico e de crítica social dos surrealistas, o grupo pregava uma arte objetiva, como reação ao idealismo romântico de Wagner e ao impressionismo de Debussy.
Daí a dramaticidade meio irônica de A Voz Humana, na qual o sofrimento da mulher abandonada é inteiramente absorvido por seu canal de expressão –uma linha telefônica a todo momento interrompida por ligações cruzadas.
A resignação da personagem a esse universo enclausurado, partilhado apenas por vozes também atomizadas e alienadas na solidão e na distância, transforma seu pesadelo em histeria, seu patetismo em melodrama.
Com isso, Cocteau e Poulenc deslocam o centro da narrativa. O sofrimento da personagem não está mais na expressividade das palavras, mas em seu diálogo com o vazio, com um amante cuja presença só se adivinha por trás dos silêncios de uma música cristalina e angustiante.

Peça: A Voz Humana
Direção: Iacov Hillel
Elenco: Raquel Barcha e Ulisses de Castro
Onde: Teatro Crowne Plaza (r. Frei Caneca, 1.360, São Paulo, tel. 011 285-4902. Estacionamento com manobrista)
Quando: sextas-feiras e sábados às 21h30, domingos às 20h30, até 18 de dezembro
Quanto: R$ 10,00

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