São Paulo, segunda-feira, 12 de dezembro de 1994
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Inflação versus geração de empregos

LAMARTINE NAVARRO JR.

A solução do problema econômico brasileiro e o sucesso do Plano Real dependem prioritariamente do controle da inflação e da geração de empregos.
Não é preciso explicar o por quê desta afirmação. Basta lembrar que a inflação corroe a nossa moeda e que a falta de empregos provoca a fome, a migração e a violência nos grandes centros urbanos.
E mais, a solução dos dois problemas deve ser concomitante. Não adianta controlar a inflação sem gerar empregos como da mesma forma seria inócuo criar empregos e manter incontrolada a espiral inflacionária. O equacionamento do problema é complexo porque a correção da inflação e a criação de empregos obrigam aplicação de políticas aparentemente antagônicas.
A atual política econômica, objetivando controlar a demanda através de taxas elevadas de juros, quando aplicada sobre a produção implica na elevação dos custos, induz a queda da produção industrial e agrícola, desestimula e mesmo impede novos investimentos em produção e assim, ao invés de gerar empregos, provoca um processo de desativação dos ainda existentes.
Adicionalmente, a baixa do dólar e a liberação das importações alimentam o consumismo e penalizam a produção, especialmente de bens destinados a exportação.
É verdade que aumenta a entrada de capital externo, porém é preciso ressaltar que os investidores estrangeiros estão muito mais interessados em especular no mercado com altas taxas de juros do que em investir em setores produtivos.
Causa espécie que o saldo conjunturalmente alto da nossa balança de pagamentos, conquistado com tantos sacrifícios, seja desperdiçado com a importação de bens não produtivos como automóveis, vinhos franceses, aparelhos eletrônicos e toda sorte de quinquilharias. E a tendência é de que nossas exportações diminuam. Vejamos o que está ocorrendo com a indústria automobilística.
O ex-presidente Fernando Collor de Mello, após classificar os automóveis brasileiros de carroças, baixou as taxas de importação de veículos para 35%. O atual governo reduziu as taxas para 20% e com dólar cotado a R$ 0,85, os carros importados ficam praticamente isentos de tributos.
E o que mais impressiona é que ninguém, nem as montadoras e nem os líderes dos trabalhadores se insurgem contra esta situação.
Basta uma simples conta aritmética, dividindo empregos diretos na indústria automobilística e seus fornecedores pela produção anual de veículos, para verificar que para cada três veículos importados, um emprego é reduzido no setor.
Onde está a Anfavea e o seu poderoso lobby, que assiste passivamente a divisão do mercado e a consequente redução da sua atividade industrial? Será que a miopia empresarial é tal, que prefere ganhar US$ 5.000 conjunturalmente em um carro importado produzido na matriz lá fora, do que ganhar US$ 2.000 em um carro produzido no Brasil? Será que não percebem que o mercado brasileiro só existe baseado na atividade econômica e que sem ela não existirá compradores no futuro?
É preciso entender que a política de abertura de importações somente é válida no curto prazo para quebrar a inércia inflacionária instalada na economia brasileira, e que no médio prazo, deve ser revista, pois compromete as bases do nosso desenvolvimento.
É preciso ponderar que, nos últimos anos, pouco aplicamos em pesquisa e desenvolvimento e assim comprometemos nossa produtividade e competitividade no mercado internacional e que também não possuímos mecanismos eficientes de proteção contra práticas abusivas de comércio via dumping e subsídios à produção.
Não podemos esquecer que nossa dívida externa não é em reais e que os juros que pagamos são altos. Seria desastroso consumir o nosso saldo com importações improdutivas e não utilizá-lo pelo menos parcialmente em um programa de liquidação da dívida, que também alimenta a inflação.
Em última análise, ponderamos a necessidade de uma imediata revisão na política de importações, com o estabelecimento de taxas indutivas que penalizem os bens suntuários e privilegiem os bens produtivos, um programa mais objetivo para aplicação do nosso saldo da balança de pagamentos e uma revisão séria e profunda dos efeitos do Plano Real na geração de novos empregos.
Em síntese, os remédios estão corretos, o que falta é dosar a intensidade da aplicação para não matar o doente.

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