São Paulo, quinta-feira, 15 de dezembro de 1994
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Burocracia emperra convênio do Oficina

ELVIS CESAR BONASSA
DA REDAÇÃO

O convênio entre o grupo Uzyna Uzona, do diretor José Celso Martinez Corrêa, e o Estado de São Paulo para a concessão do Teatro Oficina voltou à estaca zero. Após um ano de negociações e promessas do governador Luiz Antonio Fleury Filho e do secretário da Cultura, Ricardo Othake, o texto do convênio foi vetado pela assessoria jurídica do governador e precisa ser refeito.
No último dia 11 de setembro, data programada para a assinatura do convênio, o grupo teatral montou uma festa –que não passou, exatamente, de uma encenação. O secretário da Cultura, presente ao evento, e o diretor teatral assinaram simbolicamente um texto que não valia nada –não estava ainda aprovado pelo órgão jurídico do governo, que viria depois a vetá-lo, em 4 de outubro.
O veto da assessoria jurídica teve dois motivos básicos: falhas cometidas pela Secretaria da Cultura e desconhecimento, por parte dos assessores, do caso Oficina.
O processo de convênio, conduzido na Cultura, deixou de cumprir alguns preceitos legais básicos. O departamento jurídico da pasta, por exemplo, não deu parecer e aprovação ao texto, medida exigida pela lei 8.666, a lei das licitações e contratos públicos.
Entre outros problemas formais, de acordo com a assessoria do governador, não houve análise e aprovação do plano de trabalho e custos apresentado pelo Oficina. "O plano não restou aprovado por nenhum órgão técnico da Secretaria da Cultura, aprovação essa que pressupõe uma criteriosa análise de seus elementos", afirma o parecer que vetou o convênio.
"O governador Fleury me ligou, disse que ia sair o convênio, o secretário de Cultura está inteiramente de acordo conosco, mas eles não exercem nenhuma influência sobre os próprios assessores", diz Zé Celso.
As falhas do processo poderiam ser corrigidas sem muita demora –coisa que, no entanto, já consumiu mais de dois meses. Segundo a Secretaria da Cultura, somente nesta semana o convênio está seguindo, com as correções, de volta para o Palácio dos Bandeirantes.
Mas o parecer vai mais longe e aborda questões de mérito. Aponta, por exemplo, que a concessão de um teatro público para um grupo teatral poderia afetar o princípio de pluralismo cultural.
"A associação interessada oferece uma visão peculiar e, necessariamente, parcial da expressão artística teatral", diz o parecer, recomendando que se evitem "privilégios que signifiquem o envolvimento do Estado com determinada cosmovisão ou orientação".
Uma afirmação que revela não um problema jurídico, mas falta de informações. O Oficina foi tombado por lei e desapropriado pelo governo estadual para garantir exatamente a continuidade das atividades do grupo comandado por José Celso.
"É o grupo de José Celso Martinez Corrêa, desde os anos 60, o único a manter a continuidade possível e cabível do teatro que pesquisa suas formas de linguagem cênica", afirma o laudo técnico que embasou o tombamento.
É uma situação singular. O tombamento não se destinou ao prédio do Oficina –que foi demolido e deu lugar à construção atual, com projeto da arquiteta Lina Bo Bardi. O objetivo foi o projeto Oficina –convertendo Zé Celso e seu grupo no caso único de pessoas tombadas como patrimônio artístico.
Nessa trama, a função da burocracia é paralisar as iniciativas para as quais falta vontade política, acredita Zé Celso. "A burocracia não é uma coisa abstrata, significa perder horas esperando para entregar um documento, fazer reuniões, consome um tempo enorme com o único objetivo da esterilidade."
O diretor vê o caso Oficina como um paradigma da situação cultural. "Na Secretaria da Cultura, eles não sabem nem para quê aquilo existe. A cultura é vista como alguma coisa parasitária, que não dá lucro e por isso nunca é prioritária", afirma o diretor.

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