São Paulo, terça-feira, 27 de dezembro de 1994
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Nem tudo está perdido para economia mexicana

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A euforia com os casos que se vendia como sucesso exige cautela redobrada. O terremoto cambial mexicano confirmou esses temores. O perigo a partir de agora é imaginar, com a tradicional ciclotimia latina, que tudo está perdido, para o México, Argentina e Brasil.
Talvez então seja oportuno alertar mais para os aspectos atenuantes da catástrofe.
Seja qual for o veredito sobre os modelos de âncora cambial, numa perspectiva mais ampla é importante perceber as diferenças entre a crise mexicana de 1994 e a de 1982. Já se disse que a história não se repete. A principal diferença está no tipo de relações financeiras predominantes. Nos anos 80 o México inaugurou uma crise que ficou conhecida como "da dívida". De um lado, os devedores. De outro, um grupo bem definido de bancos "sindicalizados", um cartel com interesses e mecanismos de articulação demarcados.
Hoje orbitam, em torno do México e outras economias ditas emergentes, uma quantidade maior de investidores, bem mais diferenciados. Há bancos operando títulos de dívida, mas também fundos de investidores institucionais, corretoras e outras instituições financeiras. Ou seja, a hiperdesvalorização mexicana causa enorme estrago, mas a forma como ele se alastra é hoje potencialmente menos perturbadora.
Há também fatores econômicos e geopolíticos globais inéditos. A começar pelo Nafta e pela disposição imediata do governo dos EUA e do FMI a apoiar o México não apenas com palavras, mas com dinheiro. Afinal, entre os maiores prejudicados estão bancos e instituições americanas. O dinheiro que os EUA oferecem ao México é, indiretamente, alívio e consolo para os próprios aplicadores norte-americanos.
Mais ainda: o Nafta representa um horizonte de negócios em que nem tudo é necessariamente negro. Alguns executivos americanos com negócios no México, especialmente na área automobilística, já declararam que encaram o problema atual como análogo ao que enfrentaram no mercado japonês.
A valorização do iene tornou os produtos japoneses muito caros, em especial os carros. A solução foi transferir fábricas para os EUA. Executivos americanos já dizem que podem fazer o mesmo. Diante da dificuldade de exportar carros agora 40% mais caros, podem ampliar seus investimentos no México. Moral da história: o terremoto mexicano põe abaixo as carteiras financeiras mas isso não significa o fim do mundo para quem pensa em investimentos produtivos, com longo prazo de maturação.
Finalmente, é preciso lembrar que os juros internacionais, em alta ao longo de 1994, estão muito longe de terem passado pela explosão que gerou a crise da dívida nos anos oitenta. E o mercado mundial está em expansão, o que significa perspectivas de exportação boas para os países que, como o México, apostaram fichas demais na ancoragem insustentável e especulativa de uma moeda de mentirinha.

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