São Paulo, sexta-feira, 18 de fevereiro de 1994
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O grande vexame

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Esbodegado pelas emoções do Carnaval, o presidente Itamar Franco não tem o que temer daqueles que estão pedindo o seu impeachment. Seria um pleonasmo, pois há muito ele vem agindo como impedido pelos fatos que não domina.
Neste particular, sua insensibilidade administrativa é mais nefasta do que o vexame (humano, é bom que se diga) na passarela carioca. Nem limpou o confete de seus cabelos e ele lança o ministro da Fazenda como candidato a sua sucessão, fazendo a óbvia ressalva: "Apesar da inflação não estar contida".
Ora, o que pode credenciar o ministro da Fazenda à sucessão seria a eficácia de uma política econômica -e até agora, apesar dos planos que a cada dia são replanejados, não há sinal de vida inteligente no setor das finanças públicas.
A mágica do ministro-candidato é meio besta: aumentou a arrecadação do governo através de impostos e do achatamento salarial da classe trabalhadora e com isso rola de barriga todos os problemas estruturais da sociedade.
Há mais de dois anos não se coloca um prego, um dormente, um mísero e escasso parafuso na engrenagem econômica do país. Tanto Itamar Franco como Fernando Henrique gastam o tempo em reuniões que nada reúnem: todos saem da sala dizendo as coisas de sempre e ameaçando providências que nunca dão certo. Mas tudo bem: o presidente não tem partido. (Acho que não tem, tinha um, o PRN que elegeu Collor e o elegeu, mas parece que atualmente é apartidário como um bispo ou um bandeirinha de futebol).
Esse presidente sem partido lança como candidato um funcionário de sua equipe sabendo: primeiro, esse funcionário não deu conta da única missão que lhe foi confiada; segundo, que esse mesmo funcionário, para continuar candidato, terá de abandonar o governo. Logo, o governo não precisa dele.
O mais desculpável em Itamar são os seus vexames de passarela. Quando ele se leva a sério, é mais lamentável e prejudicial ao país. O que nos salva é o embaixador José Aparecido, que neste momento está em Fátima, com suas venerandas tias, orando por nós e purgando os pecados da nação.

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