São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 1994
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Porque somos contra o projeto Faria Lima

SIEGBERT ZANETTINI

O projeto consolida a anacrônica visão urbanística da cidade como empreendimento
Várias são as questões que colocam o projeto de lei denominado "Operação Urbana Faria Lima" sob julgamento público contrário, como vem ocorrendo por 94,18% da população residente nos bairros de Pinheiros, Itaim, Vila Olímpia e Vila Funchal, e 55% da população de São Paulo. Comentemos cada uma delas:
Esse projeto, embora se coloque como um programa de melhorias e como continuidade viária de extensão dos dois extremos da av. Faria Lima de um lado, ligando o atual trecho da mesma com a av. Pedroso de Moraes e de outro com a av. Hélio Pellegrino, na Vila Olímpia, nesses casos usando como suporte a antiga lei 7.104/68 de extensão da Faria Lima, e acrescidos de nova parte, utilizando como base a antiga Lei Funchal (8126/74), na realidade, abrange nada menos de 4,5 milhões de m2, numa extensão de área que vai do Alto de Pinheiros ao Brooklin e do rio Pinheiros até o contorno da av. Faria Lima e circunvizinhanças da av. Santo Amaro e av. Hélio Pellegrino.
Portanto, este projeto com tal magnitude e dimensões está sendo proposto sem se integrar a qualquer projeto urbano maior que estude as consequências e os impactos em toda a região sudoeste da cidade.
Como proposta isolada, sem nenhum diagnóstico ou análise que o defenda na questão do meio ambiente da cidade e da metrópole, sem nenhuma menção que coloque a cidade como um projeto cultural, se restringe a consolidar a anacrônica visão urbanística da cidade como empreendimento, reduzindo-a a condição de cidade-negócio, como qualquer mercadoria que se vende e se compra, e como qualquer aplicação que deve resultar em um retorno satisfatório.
É melancólico a pobreza do projeto que teima em reduzir a isso a questão urbana da principal cidade do país. Questões como a necessidade do resgate do espaço público, detonado em sucessivas administrações; as prioridades da cidade no que tange aos serviços de saúde e educação, a necessidade de uma imensa oferta de moradias que, por ironia, com esse projeto expulsa milhares de moradores de quatro bairros históricos e consolidados; a questão da mudança de qualidade do transporte alterada pela lógica perversa do automóvel como transporte predominante, em detrimento de um transporte coletivo de alta capacidade e não poluidor (metrô, ferrovia etc); a questão da promoção e resgate da cidadania no que tange a propostas dessa dimensão que devam ser apresentadas e debatidas com a sociedade e seus órgãos representativos, com decisões a serem efetivadas no Legislativo, como o local de debate e decisão do desenvolvimento da cidade.
Enfim, que compreenda a cidade como um projeto cultural e coletivo, como o lugar da vida, encontro e convivência de seus habitantes, principais personagens e para os quais devem ser dirigidas todas as preocupações urbanas, com um urbanismo que respeite as leis, a história e preserve o meio ambiente e a memória da cidade, que entenda a estrutura espacial da mesma, articulada em torno da ferrovia, e se preocupe com a descentralização das atividades, para além da região entre rios o espaço compreendido entre os rios Pinheiros, Tietê e Tamanduateí –direcionando-se para as três quartas partes da cidade dessassistidas de tudo, inclusive de transporte decente.

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