São Paulo, quarta-feira, 23 de fevereiro de 1994
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Cheiro de prefixação

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – Quem está totalmente confuso com o noticiário dos jornais a respeito da URV, pode ficar tranquilo, porque está em boa companhia. "Pelo noticiário dos jornais, eu não consigo entender o que eu mesmo vou fazer", ironiza o ministro Fernando Henrique Cardoso, o pai da URV.
É o que antigamente se chamaria uma "boutade", mas, às vezes, dá a impressão de que é algo mais do que isso. Afinal, as medidas provisórias que darão forma legal à URV devem sair no "Diário Oficial da União" do dia 28, segunda-feira, dentro de seis dias, portanto. E até ontem nem o ministro sabia como exatamente vai ser feita a indexação dos salários.
Será pela média, isso é certo. Mas como estabelecer uma indexação que não reduza o poder de compra dos salários, não estava claro nem para o ministro.
No Congresso, então, as dúvidas são portentosas a respeito de quase tudo. Uma coisa parece certa: haverá fortes resistências à indexação dos preços pela média. O deputado Delfim Netto (PPR-SP), que garante que vota a favor da média, por se declarar incapaz de romper com suas convicções, acredita que a grande maioria de seus pares não acompanhará o seu voto.
Delfim levanta, aliás, uma questão digamos interessante: se a MP chegar ao Congresso no dia 1º de março e não for aprovada nos 30 dias subsequentes terá que ser reeditada. Aí, estaremos no dia 1º de abril, véspera da desincompatibilização de FHC. O ministro sai sem a URV?
FHC jura que a questão eleitoral não está em sua cabeça, até porque a convergência do plano econômico com o plano eleitoral atrapalharia tudo. Pode ser, mas é difícil convencer os congressistas.
Diante de tantas nebulosas, a URV começa a parecer uma prefixação com outro nome. O governo já livrou da URV as sensíveis aplicações financeiras. Já tirou também suas receitas da indexação pelo novo instrumento. Ficaram, na essência, preços e salários. Como a URV seguirá o dólar e este pode ser contido pelo governo, tudo fica com cheiro de prefixação.
Menos mal que faltam só seis dias para conferir.

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