São Paulo, quinta-feira, 24 de fevereiro de 1994
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La vie en rose

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – Se fosse possível olhar a realidade brasileira com um binóculo invertido (aquele que, em vez de aproximar a imagem, afasta da lente o objetivo), o cenário seria certamente bem menos negativo, ao menos na visão do economista Ibrahim Eris, ex-presidente do Banco Central e um dos raros economistas que mantém a frieza e não vê as coisas com excesso de paixão.
Eris recupera no baú de suas memórias o quadro que havia quando ele se envolveu na elaboração do Plano Collor, antecedente mais próximo do Plano FHC, e fica com muita inveja das condições atuais. As reservas internacionais, por exemplo, eram de US$ 3 bilhões. Hoje, são 11 vezes superiores. O déficit público empinava para a altura de 6% do Produto Interno Bruto (PIB, medida da renda nacional). Agora, está virtualmente zerado, ainda que com alguns artifícios que só valem para o médio prazo.
Mais: a economia é hoje mais aberta do que nunca e, portanto, as importações podem ser usadas como mecanismo de freio a reajustes abusivos de preços. Hoje, lembra Eris, há um sistema já institucionalizado de importações, ao contrário do que ocorria no Plano Cruzado, por exemplo, quando se tentou importar precipitadamente e houve um estrondoso fracasso.
Por tudo isso, Eris tem a certeza de que, no curto prazo (até o fim do ano, digamos), o Plano FHC vai dar certo e trará a inflação para patamares "bem baixos". É claro que subsistem, na visão de Eris, problemas estruturais de ajustamento do Estado brasileiro (o sistema tributário, as privatizações etc.) que derrubarão o plano mais adiante, mas o futuro longínquo (e, no Brasil, 1995 é além da eternidade) fica para outra história.
Até porque Eris calcula que o melhor momento do plano, em termos de inflação reduzida, ocorrerá entre agosto e setembro. É também o momento decisivo para a eleição presidencial. Um ministro que tenha perpretado a proeza de levar a inflação a seu ponto mais baixo a um ou dois meses da eleição terá enormes chances de ser o futuro presidente da República, se conseguir se candidatar.
Talvez Eris se engane, mas, ao menos uma vez a cada dez anos, é divertido usar o binóculo dessa forma.

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