São Paulo, sábado, 5 de março de 1994
Próximo Texto | Índice

Presidente potencial

TASSO JEREISSATI

Fernando Henrique Cardoso surpreendeu a todos quando, ao assumir o Ministério da Fazenda, não recorreu ao habitual "economês" dos técnicos nem assumiu a habitual postura distante dos chefes das finanças do país. Optou por uma linguagem simples, direta, clara e objetiva para mostrar o diagnóstico da dramática situação econômica do país. Deixou o conforto do gabinete para perseguir de forma obstinada o diálogo e o entendimento.
As críticas não eram poucas. Dizia-se por aí que "tudo isso é papo", ou "não vai dar em nada". Aos olhos do mundo político, parecia uma pretensão inominável a criação do Fundo Social de Emergência, que implicou a desvinculação de verbas constitucionais.
Aliado à descrença dos políticos, o Congresso Nacional vivia um verdadeiro caos, amarrado, "cepeizado", com lideranças importantes sendo decepadas por denúncias de corrupção no Orçamento, enquanto os partidos estavam rachados, com lideranças pulverizadas. De outra parte, o governo de transição, heterogêneo, com disputas internas e as crises naturais, formavam o cenário perfeito para o pessimismo absoluto.
Pouco a pouco, foi sendo notado que com seu estilo conciliador e democrático, mas ao mesmo tempo persuasivo e sedutor, Fernando Henrique Cardoso foi vencendo obstáculos até cumprir todas as diretrizes prometidas, superando, uma a uma, barreiras políticas aparentemente intransponíveis.
Há algum tempo, ouve-se um diagnóstico quase unânime sobre o impasse brasileiro: o problema brasileiro não é econômico, mas político. E o que é problema político senão a falta de uma grande articulação, envolvendo Congresso e a sociedade, que seja capaz de bancar um projeto de mudanças e transformações tão necessário ao Estado brasileiro?
Neste momento, está deflagrado o processo sucessório no país. Vai ficando cada vez mais claro que surge o homem capaz de fazer as reformas transformadoras. Um homem com sua história muito mais ligada aos problemas sociais do que econômicos.
Este homem, Fernando Henrique Cardoso, surge como alguém com capacidade de negociar e também de realizar, transitando por todas as áreas da sociedade brasileira –dos empresários aos sindicatos, passando pelos intelectuais, como um "primus inter pares".
Ora, é justamente deste perfil de presidente da República que o Brasil precisa para resolver seus graves problemas: miséria, analfabetismo, desemprego e mortalidade infantil.
O plano de estabilização já venceu a fase de negociação política. Agora, é a fase de coordenação técnica e de gerenciamento. A capacidade demonstrada por Fernando Henrique Cardoso ao longo de sua vida pública, mas, principalmente, neste período em que está a frente do Ministério da Fazenda, não pode ser desprezada. Não se pode limitar esse potencial em função do calendário político ou da necessidade de gerenciamento técnico de um plano que já está em andamento –e com sucesso.
Esse capital deve ser colocado à disposição de um projeto muito maior, mais abrangente, para ser executado num período mais longo –a serviço do país. Além disso, este grande projeto de transformação nacional tem como parte integrante a continuidade do programa de estabilização econômica, do qual Fernando Henrique não se desvincula.
É a liderança desse projeto mais amplo que irá consolidar a execução da fase final do programa de estabilização.

Próximo Texto: A tentação conservadora
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.