São Paulo, segunda-feira, 7 de março de 1994
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Canto gregoriano tenta sobreviver no Brasil

HÉLIO GOMES
DA REDAÇÃO

O canto gregoriano está em alta, pelo menos fora dos limites de nosso país. A milenar forma de oração católica criada por São Gregório em fins do século 6 ganhou fôlego na Europa e conquistou o planeta. No Brasil, a situação é exatamente oposta. Um exemplo: o único coral do país –e da América Latina– convidado a participar do mais importante evento mundial do gênero corre o risco de não fazê-lo por absoluta falta de condições financeiras.
O coral em questão é o paulistano São Pio 10º, e o evento, o 5º Festival Internacional de Canto Gregoriano, em Bruxelas, na Bélgica, de 13 a 15 de maio. O coral foi fundado em 1984 e é dirigido desde então por madre Maria do Redentor, cujo nome real é Eleanor Florence Dewey. Inglesa, madre Maria passou 48 de seus 81 anos trabalhando em favor do canto gregoriano no Brasil. Além de dirigir o São Pio 10º, ela dá aulas de canto aos noviços do mosteiro de São Bento.
Para viabilizar a viagem de pelo menos parte dos 20 integrantes do coral –advogados, bancários, secretárias, estudantes, aposentados e apenas um padre–, a diretora diz que se uma empresa se dispuser a cobrir os custos da viagem, o coral oferece em troca a gravação de um disco promocional.
"Qualquer doação seria muito bem recebida", diz madre Maria. Os interessados em viabilizar a participação do coral no festival belga podem entrar em contato com a direção do coral nos telefones (011) 231-5346 e 288-3514.
BeneditinosApesar da frustrante situação do coral São Pio 10º, o canto gregoriano brasileiro dá sinais de vida em Ponta Grossa, cidade do interior paranaense. Lá está situado o mosteiro da Ressurreição, comunidade de monges beneditinos localizada na área rural do município.
No mosteiro, o canto gregoriano faz parte da rotina diária de cada monge. Nesse caso, o significado dos cânticos é o original. São orações que marcam os rituais diários da vida monástica. Porém, um ingrediente inédito foi acrescentado à tradição beneditina. Os monges do Paraná substituíram o latim original dos cânticos e passaram a cantá-los em versões traduzidas.
Os monges gravaram duas fitas cassete –"Glorificai o Nosso Deus" e "Ressuscitou Aleluia"– produzidas pela Edições Paulinas, editora de livros católicos (leia crítica nesta página). Um CD com o material contido na segunda fita será lançado em breve pela editora.
"Traduzimos os cânticos porque acreditamos que é difícil celebrar algo que não se entende", diz o monge Agostinho Ramos, 30, que vive junto aos religiosos de Ponta Grossa há um ano e dois meses. Segundo Ramos, a intenção dos monges é levar o canto gregoriano ao maior número de pessoas, de maneira compreensível. "Queremos levar cultura ao público. O canto gregoriano é um tipo de música que pode levar à meditação e ao relaxamento", diz.
A tradução é criticada por Madre Maria do Redentor. "O canto perde a pureza. Traduzir os cânticos do latim para o português é quase uma heresia", afirma. Já o monge Ramos considera o fato uma "adequação, e não uma concessão. Acho que estamos em outros tempos".

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