São Paulo, segunda-feira, 7 de março de 1994
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Monges beneditinos cantam em português

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

O canto gregoriano está geralmente associado a uma impressão de espiritualidade repousante, ou então a uma idéia meio difusa de que ele contém a matriz da harmonia polifônica, capaz de, nos dez séculos seguintes, inseminar toda e qualquer música sacra e profana. É, no fundo, bem isso.
Os monges beneditinos do Mosteiro da Ressurreição, em Ponta Grossa (PR), fornecem, em "Ressuscitou, Aleluia" e "Glorificai o Nosso Deus", um exemplo precioso de gravações que mantêm a ortodoxia técnica do gênero, com uma pequena liberdade heterodoxa que consiste em executar as vésperas, laudes e salmos em português.
Não há nisso nenhum sacrilégio com relação às instruções de São Gregório, o Grande (papa entre 590 e 604), autor de uma operação bem-sucedida de unificação musical. Para quem não sabe, Gregório (que deu o nome ao canto) efetuou, por meio da música, uma unificação litúrgica com uma inegável vertente política. Queria desarmar seitas e dissidências da igreja ao neutralizar as diferentes maneiras com que os cristãos interpretavam, a partir de tradições pagãs, a mesma herança musical da antiguidade, tal qual ela fora sintetizada pela igreja do Oriente.
O trabalho que os monges paranaenses desenvolvem, sob a regência de Marcos Júlio Sergi, fundamenta-se nas transcrições de cantos feitas a partir do século 15. O uso de um idioma que não o latim é uma das muitas liberdades possíveis quanto às interpretações originais, que nos são, a rigor, uma grande incógnita.
Até a baixa Idade Média, as formas de notação musical eram precárias. Os chamados antifonários do século 9, ancestrais longínquos da escrita em pentagrama, são ainda hoje um desafio para os musicólogos. Um deles, o alemão Nikolaus Harmoncourt, afirma, por exemplo, que pouco se sabe sobre a sonoridade da música nos tempos de Gregório.

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