São Paulo, sábado, 12 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Itamar libera FHC para deixar o governo

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL A SANTIAGO

O presidente Itamar Franco afastou ontem, na prática, o único argumento que vem sendo esgrimido, em meios políticos e empresariais, como obstáculo para a candidatura à Presidência do ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso. "Se o ministro quiser sair, pode sair porque o plano não sofrerá nenhuma consequência", disse o presidente em entrevista coletiva no hotel Sheraton, em Santiago.
Até agora, alguns políticos e muitos empresários vinham dizendo que, se o ministro deixar o cargo, seu plano econômico poderia naufragar. Agora que o chefe de FHC o liberou, não fica de pé argumento algum contra a eventual candidatura. Itamar fez vários elogios ao ministro –"político correto, com passado, inteligente"– e disse que entrará "democraticamente" na campanha presidencial "se o governo tiver candidato".
Pergunta - Quando o sr. diz que, no dia 2 de abril, começa de fato o processo sucessório, o sr. parece indicar que o ministro Fernando Henrique será candidato, já que é o único governista pendente dessa data, pois os outros são de oposição.
Itamar - Não é isso. É preciso ver o quadro todo. Quem é que vai deixar o governo? O ministro vai deixar o governo? Ele disse que não vai.
Pergunta - Disse ao sr. ou pela imprensa?
Itamar - Ele me escreveu uma carta, já faz algum tempo, dizendo que não sairia. Foi em dezembro. De lá para cá, não conversamos sobre isso.
Pergunta - Se ele não sair, o governo escolheria um candidato dentro do quadro que estará colocado a partir de 2 de abril?
Itamar - É um processo que tem seu tempo certo. O dia 2 de abril é, como na física, o "V zero", a velocidade inicial do processo sucessório. Quais são os governadores, os prefeitos, que vão deixar o governo? Como é que o quadro será montado? A partir de abril, começa a ser montado o mosaico político brasileiro.
Pergunta - O sr. imagina que algum ministro deixe o cargo para se candidatar?
Itamar - Não sei. É uma decisão individual. Mas qualquer ministro terá a liberdade de deixar o cargo se quiser se candidatar.
Pergunta - Mas, no seu governo, o mais 'presidenciável' é o ministro FHC.
Itamar - Fica tudo muito na base do 'se'. O ministro Fernando Henrique Cardoso declarou ontem (quinta) em Buenos Aires que não é candidato. O "Jornal do Brasil" noticiou que ele havia conversado comigo sobre a candidatura. A informação não é verdadeira. O ministro não me informou que é candidato. Ele vai a Washington agora. Continua trabalhando no processo de seu ministério.
Pergunta - O ministro FHC tem dito em conversas mais ou menos reservadas que a saída dele depende também muito de o sr. liberá-lo ou não. Se ele perguntar ao presidente se pode ser candidato, o que o sr. responde?
Itamar - Depende do que diz a alma dele e do que diz o seu partido. Eu posso dizer que gostaria que ele fosse candidato e ele pode me responder que não quer ser candidato. Aí, a situação ficaria mais difícil. Prefiro que o ministro me diga: olha, Itamar, eu vou ser candidato. Mas ele não me disse ainda. Se tivesse dito, eu diria a vocês.
Pergunta - O plano econômico, embora não tenha sido lançado para isso, pode fazer nascer uma candidatura forte se derrubar a inflação.
Itamar - Concordo em parte quando você diz que, baixando a inflação, melhora a posição do presidente. Mas a verdade é que, mesmo com inflação baixa, o problema do desemprego persiste, é muito alto. O plano do ministro Fernando Henrique não é um plano de cunho eleitoral. Se fosse, não começaria por onde estamos começando, pela parte mais difícil, que é o combate ao déficit público. Seria mais fácil tentar um plano para sobreviver durante cinco ou seis meses. Portanto, a candidatura do ministro Fernando Henrique, se ele for candidato, não estará baseada no plano. Estará baseada na sua condição de político correto, um político com passado, intelectual, um homem de inteligência. É preciso que se tenha vivência política e ele a teve em dois ministérios da maior importância. É um homem que pode se apresentar, se for candidato, como um homem que conhece os problemas do Brasil e saberá resolvê-los.
Pergunta - O plano não pode sair prejudicado se ele sair candidato e deixar o Ministério?
Itamar - É evidente que o plano não é do ministro. É do governo e da sociedade. O ministro não será impedido de sair por causa do plano. Isso não é obstáculo que se coloca à sua saída. O obstáculo que se coloca é o que eu já disse: a sua vontade, o seu desejo, aquilo que ele imagina que possa ser melhor para ele e para o país. O ministro é um homem que pensa muito no país. Não pensa só nele. Por isso tem demonstrado um desejo muito grande de ver o país estabilizado economicamente.
Pergunta - Como o sr. faz tantos elogios ao ministro, não seria difícil encontrar um substituto para ele?
Itamar - Não digo que seja difícil, porque, agora, trata-se do gerenciamento do plano, que não vai exigir tanto. Volto a dizer: se o ministro desejar sair, pode sair porque o plano não sofrerá nenhuma consequência.

Texto Anterior: Congresso já fez quatro alterações na Constituição
Próximo Texto: FHC elogia Hélio Garcia
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.